Artes Visuais, o curso “esquecido”

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Os alunos do curso de Artes Visuais da UALG sentem-se “esquecidos” e reclamam por melhores condições. A água das últimas chuvas destruiu vários trabalhos. Os alunos prometem continuar esta luta, que já dura há vários anos

As fortes chuvas que caíram em Faro no final de março causaram estragos na Universidade do Algarve, afetando principalmente os alunos do curso de Artes Visuais. De um momento para o outro, trabalhos dos alunos feitos ao longo dos anos e que iriam ser expostos no final da licenciatura ficaram totalmente destruídos.

Os alunos de Artes Visuais estão, há três anos, a trabalhar e a estudar nos Serviços Técnicos da Universidade do Algarve, no campus da Penha, pois foram “expulsos” dos seus laboratórios que deram lugar ao novo UAlg Tec Campus – Acelerador de Empresas.

A existência de humidade, a falta de condições de acessibilidade e de salas de convivência, portas avariadas, falta de iluminação de emergência e a possibilidade de ocorrência de curtos-circuitos.

Instalações do curso de Artes Visuais, na Ualg

Trabalhos de anos perdidos em segundos

“Estas salas não têm condições nenhumas. Quando choveu recentemente isto inundou tudo. Eu estou cá há três anos e perdi praticamente todos os meus trabalhos. Eram trabalhos já avaliados, mas que foram guardados para uma exposição que acontece sempre no final do curso que conta para avaliação”, começa por contar uma aluna do curso ao JA, que não se quis identificar.

Após o sucedido, os alunos falaram com os professores relativamente à avaliação, mas foi-lhes dito que têm de refazer todos os trabalhos e “não há ninguém que se responsabilize”.

“Nós gastámos o nosso tempo e dinheiro e não há ninguém que se queira responsabilizar pelos estragos. Foram destruídos os trabalhos de quase todos os alunos, porque das quatro salas, apenas uma não ficou inundada”, acrescenta.

Os alunos decidiram então enviar uma carta aberta à reitoria da Universidade do Algarve, que está disponível na internet e acompanhada de fotografias e vídeos dos estragos da chuva, mas não obtiveram resposta, partindo assim para uma manifestação pacífica e silenciosa.

“Nós já andamos a lutar por melhores espaços há três anos, só que ninguém nos responde a e-mails e a cartas. Normalmente escrevemos cartas todas as semanas para a reitoria e tínhamos um caso aberto no Ministério da Educação, mas acabou por ser fechado. Nunca tivemos resposta de nenhum dos dois”, conta a aluna ao JA.

Nessas cartas estão descritos todos os problemas que os alunos sofrem, onde é descrito que os “os tetos estão literalmente a rachar e a cair, os telhados estão cheios de amianto, as salas são muito frias de inverno e muito quentes de verão e os ares condicionados não funcionam”.

“Nós só queremos salas novas”

Já a Universidade do Algarve, em declarações ao JA, confirmou o sucedido e refere que “de imediato” se procederam as ações de limpeza do local.

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“Os professores foram de imediato informados do lamentável e inesperado episódio de inundação e tiveram conhecimento das suas consequências. Os mesmos professores, sob a orientação da direção de curso, analisaram a situação e decidiram adiar e reagendar os momentos das avaliações intercalares ainda por realizar, de forma a dar tempo aos alunos para desenvolverem os trabalhos”, refere.

Os esquecidos da UAlg

A água destruiu os trabalhos na sala de aula

O JA falou com atuais e antigos alunos do curso de Artes Visuais da Universidade do Algarve, que não quiserem ser identificados, e o sentimento é o mesmo: consideram-se e sentem-se esquecidos pela instituição e até pela Associação Académica.

“Desde sempre que nos sentimos de parte, até pela Associação Académica da Universidade do Algarve, apesar de agora parecerem estar mais interessados em nós devido à publicação que fizemos nas redes sociais acerca da destruição da chuva”, explica a aluna ao JA.

A estudante de Artes Visuais salienta ainda que as salas onde trabalham estão “escondidas” do resto da universidade e que “há muitos alunos que não sabiam que existia o curso de Artes Visuais”.

Este sentimento é também partilhado por professores do curso de Artes Visuais da Universidade do Algarve, que também frequentaram a instituição.

“Há professores que dizem que na época deles a situação era mais ou menos a mesma. No entanto, quando estávamos nos complexos, era diferente. Apesar de não ser o melhor espaço, as condições eram melhores, haviam mais salas e galerias e existia o mestrado, que desapareceu porque agora não há salas”, acrescenta.

Já com estas dificuldades, os alunos também tiveram problemas durante a pandemia de covid-19, pois “é impossível” existir distanciamento social.

“Nós trabalhamos uns em cima dos outros. Durante a pandemia de covid-19 foi horrível. Muitos de nós nem trabalhávamos na escola porque não havia distanciamento. Trabalhávamos em casa. Mas trabalhar em casa não ajuda nada porque nós fazemos coisas grandes”, conta.

Em declarações ao JA, a Universidade do Algarve garante que esse sentimento “não existe”.

“Todos os alunos são iguais para a Universidade do Algarve. Com os recursos que dispomos procuramos proporcionar aos estudantes as melhores condições possíveis, as quais consideramos adequadas para as especificidades de cada curso e área científica”, refere.

Associação de Estudantes está solidária

A Associação Académica da Universidade do Algarve, em comunicado, diz estar “solidária com os estudantes, não aceitando menos que a procura de soluções com vista a resolução desta problemática”.

O presidente Fábio Zacarias acrescenta ainda que foi convocada uma reunião com a equipa reitorial da UAlg, “de forma a debater um conjunto de medidas e soluções que satisfaçam as necessidades de trabalho e consequentemente os métodos excecionais de avaliação, uma vez que as inundações acabaram por danificar os trabalhos e projetos”.

Contactado pelo JA, o presidente da Associação Académica da Universidade do Algarve não quis comentar esta situação, remetendo para o comunicado oficial publicado nas redes sociais.

Já a Universidade do Algarve garante que esta reunião “ainda não aconteceu” e que “a reitoria da Universidade do Algarve sempre esteve e sempre estará disponível para ouvir os seus alunos e conjuntamente trabalhar para encontrar as soluções mais adequadas e possíveis”.

Também há problemas nas Gambelas

um caderno de trabalhos danificado pela chuvas

Além da Penha, no campus das Gambelas, há relatos que as condições de alguns edifícios também já não são as melhores. Ao JA, uma aluna revela que no Complexo Pedagógico e no edifício 2 da Faculdade de Ciências e Tecnologias, quando chove, são colocados baldes nos corredores e salas para que a água não se espalhe pelo chão.
A mesma aluna conta ao JA que os pavilhões chamados de Jotas “nunca tiveram condições para haver aulas”.


“Lembro-me de ter lá exames e cair água da chuva pelo ar condicionado”, conta.


Ao JA, a Universidade do Algarve refere que “tem um vasto parque imobiliário, tanto no campus de Gambelas e no da Penha, e em menor dimensão em Portimão”.


“É normal surgirem anomalias nos equipamentos, dada a sua utilização ou deterioração com o decorrer do tempo. Com os orçamentos disponíveis e possíveis, todos os anos são inscritas obras de manutenção, reparação, e melhorias várias. Sempre que surgem “problemas” inesperados, como por exemplo, uma infiltração de água ou avaria de um equipamento, dentro do possível, é feita reparação ou pelo menos, tenta-se minimizar os estragos ou inconvenientes. Não há, contudo, atualmente, nenhum constrangimento que impeça o regular funcionamento das atividades na instituição”, acrescenta.

A manifestação pacífica

A manifestação decorreu no dia 30 de março, ao mesmo tempo que era inaugurado o UAlg Tec Campus – Acelerador de Empresas da Universidade do Algarve, que teve um investimento superior a sete milhões de euros.

Nesta inauguração estiveram presentes a ministra da Coesão Social, Ana Abrunhosa, o reitor da Universidade do Algarve, Paulo Águas, o presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, José Apolinário, o presidente da Câmara Municipal de Faro, Rogério Bacalhau e a Comissária Europeia para a Política de Coesão e Reformas, Elisa Ferreira.

Durante o discurso de Paulo Águas nesta inauguração, o atual reitor lembrou os problemas dos alunos do curso de Artes Visuais, justificando a opção de retirar espaço a esses estudantes e transferi-los para os serviços técnicos.

“A UAlg também fez aqui um esforço, porque teve de adaptar espaços e atividades que se realizavam aqui, e que tiveram de ir para outros espaços que ainda não são os melhores locais. Temos de trabalhar nesse sentido, de dar melhores condições aos alunos de Artes Visuais, que não foram despejados, foram para um sítio que consideramos adequado, mas que não é ainda o melhor local. Tinha de fazer esta nota de reconhecimento porque estamos aqui para os estudantes”, refere.

Da Penha para as Gambelas

Em declarações ao JA, a Universidade do Algarve refere que o funcionamento do curso de Artes Visuais deverá mudar-se do campus da Penha para as Gambelas, uma iniciativa inserida no plano estratégico 2021-2025, “recentemente aprovado pelo Conselho Geral”.

No entanto, segundo a reitoria, “as atuais instalações foram alvo de adaptações para dar uma adequada resposta às necessidades do curso de Artes Visuais”.

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