Atrasos nas juntas médicas levam doentes ao desespero

Nas últimas semanas têm chegado ao JORNAL do ALGARVE relatos de doentes oncológicos (e não só) que esperam e desesperam meses, em alguns casos anos, por uma junta médica e emissão de atestados médicos de incapacidade multiuso (AMIM), documentos fundamentais para que os doentes tenha acesso à prestação social para a inclusão, isenção de trabalho, entre outros apoios. A Administração Regional de Saúde (ARS) do Algarve explicou a JA o que se está a passar e o que está a ser feito para resolver uma situação que afeta milhares de pessoas

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“Doentes, muitos deles com cancro, muitos deles terminais, esperam e desesperam por uma junta médica que lhes poderá proporcionar apoio financeiro e isenção de trabalho. Isto no Algarve, em Faro”, revela fonte do JA.

“Pessoas a fazerem quimioterapia, muito debilitadas que entregaram atestado hoje, por exemplo, terão que esperar até final do ano (…) em vez dos dois meses que são anunciados”, contesta a mesma fonte.

De facto, na página da Internet do SNS24 afeta ao AMIM pode ler-se que “depois de um utente fazer o pedido de avaliação médica vai receber uma notificação da junta médica, num prazo de 60 dias, com a data e hora de uma consulta na qual é feita a atribuição do grau de incapacidade”.

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Na sequência destes relatos, solicitámos à ARS do Algarve um esclarecimento relativo aos atrasos nas juntas médicas e na emissão dos respetivos atestados médicos de incapacidade multiuso na região. O JA questionou a ARS sobre quantas pessoas estão a aguardar por uma junta médica na região, mas essa questão não foi esclarecida por aquela entidade.

“A suspensão das Juntas Médicas de Avaliação de Incapacidade (JMAI) após o início da pandemia por Covid-19 deu origem ao acumular do número de requisições para avaliação de incapacidade”, justifica aquela entidade de saúde regional ao JA.

“Esta é uma realidade que a Administração Regional de Saúde do Algarve tem procurado ultrapassar desde a reativação das Juntas Médicas, sem descurar que ainda há Agrupamentos de Centros de Saúde (ACeS) com um registo significativo de pedidos pendentes”, reconhece.

Segundo dados facultados pela ARS do Algarve ao JA, o ACeS Central, que tem como área de intervenção os concelhos de Albufeira, Faro, Loulé, Olhão e São Brás de Alportel, é o que apresenta maior número de pedidos pendentes, mas é também o agrupamento com registo de maior número de utentes.

Recorde-se que o Atestado Médico de Incapacidade Multiuso é um documento que comprova o grau de incapacidade física ou mental, permanente ou temporária, de um utente.

A emissão e apresentação desse atestado é fundamental para aceder à prestação social para a inclusão, mas também para aceder a outros apoios sociais, benefícios fiscais e no IRS, reduções no crédito à habitação ou nas rendas apoiadas e até na compra de automóvel.

Durante os primeiros cinco meses deste ano, na ARS do Algarve foram realizadas “1765 JMAI”, contabiliza.
“Com o intuito de criar respostas para melhor servir os utentes e construir soluções que vão ao encontro das reais necessidades da população, a ARS Algarve criou, recentemente, uma nova Junta Médica”, avança, sublinhando que “(…) só nos meses de abril e maio foram requeridas 1166 JMAI, pelo que a ARS Algarve tem vindo a procurar soluções para dar resposta ao número de requisições efetuadas, mediante o reforço das suas equipas”.

A ARS explicou ainda ao JA que o ACeS Barlavento e o ACeS Sotavento “não apresentam pedidos pendentes para JMAI referentes aos anos transatos”.

Relativamente aos doentes oncológicos, aquela entidade relembra “que a Lei n.º 14/2021, de 6 de abril concede ao hospital que realiza o diagnóstico do doente a possibilidade de emitir o atestado médico de incapacidade multiuso para benefícios sociais e económicos previstos na lei. Esta solução é válida para o doente com um grau mínimo de incapacidade de 60% no período de cinco anos após o diagnóstico e dispensa a constituição de Junta Médica”.

Governo compromete-se com novo modelo até final do ano

A secretária de Estado da Promoção da Saúde comprometeu-se, no dia 7 de junho, ter até final do ano uma proposta para novo modelo de juntas médicas, assim como para resolver o problema da recolha de informação.

Margarida Tavares, que falava aos deputados da Comissão Parlamentar de Saúde, onde foi ouvida sobre a matéria, disse que o trabalho está a ser feito por uma equipa com elementos das várias áreas governativas e afirmou: “Garanto que vamos ter todos os instrumentos este ano”.

A governante explicou que este grupo técnico está a trabalhar para propor “um novo modelo que permita responder às novas exigências”, tornando o processo “mais fluido e mais capaz”, e reconheceu as dificuldades enfrentadas devido à falta de homogeneidade na recolha de informação por parte das diferentes instituições.

Explicou que o trabalho está a ser feito em três vertentes: olhar para as tabelas das incapacidades para conciliar conceitos “sem prejudicar benefícios adquiridos”, trabalhar nos sistemas de informação para resolver os problemas de homogeneização e acesso igual aos sistema, assim como da interoperabilidade, e, por último, definir um novo modelo, para perceber quem faz as juntas médicas, em que situações podem ser dispensadas e que casos devem ser reavaliados.

Margarida Tavares reconheceu que “com o esforço que está a ser feito” não se está a conseguir recuperar os atrasos, explicando que “as entradas já são maiores do que a capacidade instalada”.

Quanto ao projeto-lei do Livre que levou a esta audição — para manter o regime transitório para a emissão de atestado médico de incapacidade multiuso para doentes oncológicos e prorrogar a validade dos atestados de incapacidade das pessoas com deficiência até que se recuperem os atrasos nas juntas médicas –, a governante lembrou que a prorrogação dos atestados já foi viabilizada.

Reconhecendo os atrasos nas juntas médicas, e consequente emissão dos certificados de incapacidade, a secretária de Estado sublinhou que o modelo tem de ser reavaliado porque “não serve as novas exigências”.
Sublinhando que este trabalho “não pode ser exclusividade dos médicos de saúde pública”, a responsável insistiu: “O modelo tem de ser avaliado em várias dimensões”.

A secretária de Estado destacou o problema existente na recolha de dados – as instituições não recolhem da mesma forma e os sistemas não estão interligados – para explicar porque não conseguia fornecer o número exato das pessoas em lista de espera para realização de juntas médicas.

“Não temos sistema de informação [completamente interligado] e isso é muito relevante. Os dados não são recolhidos de forma igual por cada ARS (…). Nuns locais são por pendências totais, noutros têm os casos em que já há agendamentos, noutros os casos em que a junta já foi feita e não foi emitido atestado“, explicou.

Sobre a recuperação dos atrasos, disse que, entre 2011 e 2018, estavam a ser feitas em média 55 mil juntas/ano e que, só em 2022 já foram realizadas mais de 85 mil. “Se extrapolássemos, chegaríamos a cerca de 100 mil”, exemplificou.

A governante admitiu ainda que a tabela (das incapacidades) precisa de ser revista, lembrando que “há soluções para incapacidades que não existiam no passado” e que “o mesmo problema de saúde pode já não condicionar o mesmo grau de incapacidade de quando a tabela foi feita”.

Quanto às dispensas de juntas médicas, admitiu igualmente que há algumas situações e há mecanismos dinâmicos e capazes de se adaptar à situação de saúde, afirmando que, nas situações oncológicas, se pode “simplificar bastante”.

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