Avarias: Coisas do confinamento 1

Perguntam – não perguntam, mas não descobri outra maneira de começar – se acho (o achismo, essa enorme qualidade tuga) bem que o Instagram, penso que terá sido o Instagram, tenha feito um boicote a Trump? Não, não acho. Esta mania que temos de aferir a ideia do que é censura pelo que nos acontece e só quando nos acontece, não me parece muito católica. Mais, há problema com alguns de nós, se não temos nada a dizer perante acções como estas, então não temos que nos queixar quando nos calha em azar sermos os censurados.

É uma coisa muito deste tempo: corremos como loucos, não paramos (correr é o contrário de parar e parar é o contrário de morrer) para pensar, e vemos o Mundo como uma sucessão de problemas em que temos que estar por detrás de uma barricada. E a nossa barricada é sempre melhor que a outra. Mais, a nossa barricada, promete a morte aos da outra, com a maior das facilidades.

Não sou especialista, mas adivinho – aqui com o dedo mindinho – que tudo se deve ao facto de sermos uma sociedade cada vez mais infantilizada, por isso vemos tudo a preto e branco, um de cada lado, maus e bons, e nós, em regra, somos os bons. Não me olhem dessa maneira: comunas e nazis, os verdadeiros os da Bayer, fizeram o que fizeram (espero que saibam o quê, não me obriguem a desfiar todo o meu conhecimento e a babar-lhos os dedos que seguram o jornal), sempre em nome do bem. Era o Homem novo que aí vinha a caminho e não havia que o atrasar com perguntas e questões de pormenor. Por isso, quem ousasse desafiar as leis da História era retirado do caminho (servia ser atropelado) de uma maneira tão enérgica e de forma a não oferecer dúvidas sobre quem ali manda.

E foi só para vos lembrar que de boas intenções está o inferno cheio. As ditaduras (todas elas, fortes e mais mansas) precisam disso, de terem as costas quentes e de se saberem ancoradas na protecção popular: por alguma razão alguém se lembrou de lhes chamar populistas. Dizer que Trump foi bem censurado é um mau caminho. Se não fosse por uma questão de princípio podia adiantar-lhes: um destes dias a censura vai estender-se a questões que neste momento nem lhes (nos) passa pela cabeça e aí sim vai ser o cabo dos trabalhos. Pode ser a ditadura da linguagem (portuguesas e portugueses; meninas e meninos, conselheiras e conselheiros; camaradas e camarados), da identidade (não se dever dizer que não se reconhecem casamentos entre pessoas do mesmo sexo, até um dia, não se poder dizer que não se reconhecem casamentos entre pessoas do mesmo sexo), ou de outra minudência (contar anedotas racistas entre amigos) que, de repente adquirem o rótulo de obrigação, não vá a polícia do pensamento levar a mal. E depois essa polícia pode decidir não noa aceitar nos tais empregos etc.

E o reverso da medalha é que serão os populistas a tirar partido disso. André Ventura sabe-o.

Fernando Proença

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