AVARIAS: Mão de fora

Opinião de Fernando Proença

 

 

Morreu George Martin produtor de – quase – todos os discos dos Beatles. Era considerado o quinto Beatle, o que me põe uma dúvida; será que não seria o quarto, por troca com Ringo Star? Esta conversa, que hei-de retomar num próximo Literatura Inclusa (o meu outro tacho no espaço do Jornal do Algarve) remonta à antiguidade clássica…mentira, tem muito menos tempo, mas faz todo o sentido: qual o papel de um produtor na feitura de um disco? Pode-se sempre esticar esta ideia. O produtor de cinema, será hoje quem manda num filme em vez do realizador? Não digo em Portugal, que a esse respeito é uma brincadeira de crianças, mas nos Estados Unidos, nos filmes de grande produção até onde irá a mão do produtor? Se calhar bastante mais longe do que a paciência do realizador para a apaziguar. Vejam só o que pode acontecer se o dinheiro investido for aplicado num argumento que tem tantas hipóteses de dar bem como Portugal de pagar a dívida externa. O que faz um produtor numa situação dessas? Tem uma reunião com o realizador e dá um murro na mesa? Aquilo é um negócio e, pelo andar da carruagem, vão perder dinheiro, há que reforçar o preço das pipocas. Consta que Hollywood tem desenvolvido uma fórmula adaptada para ir resolvendo esses problemas, entregando os filmes a directores – produtores (ou produtores – directores), que tentarão, de um ponto de vista puramente teórico unir o melhor dos mundos: dinheiro e favor da crítica. Se calhar o filme será um pastel conservador, provavelmente cheio de efeitos especiais, sem jeito nem proveito, mas entre perder dinheiro e ter más críticas, optarão pela segunda hipótese. Lembro-me de um realizador português ter dito que mudou todo o argumento (durante a viagem de avião) de um filme que ia fazer em Cabo Verde. Tinha conseguido financiamento a partir de uma história, tinha-a mudado e parece que não ia acontecer nada (como não aconteceu). Consta que ninguém viu o filme. O que se pode dizer em contraditório? Que ninguém o veria, mesmo que fosse respeitada a primeira história? Assim já escapa! Eu sei que um produtor de cinema não terá a mesma figura legal que um produtor de música (têm papéis diferentes porque as fontes de financiamento são diferentes), mas a ideia é que alguém de fora intervém no processo criativo, alterando (ou podendo alterar significativamente) a obra final. Lembro-me sempre neste aspecto particular a importância que os editores de livros têm no mundo anglo-saxónico. Em Portugal não vejo que qualquer escritor da classe média alta possa discutir o que quer que seja com o editor. Numa entrevista recente Ian Mcwean revelava a importância que o seu editor tem nos cortes e alterações que faz em cada livro que escreve. Gostava de ver António Lobo Antunes aceitar a ideia do editor de cortar cinquenta páginas num seu romance. Por isso relembro a importância de George Martin no trabalho dos Beatles (sempre enaltecido pelos músicos) e já agora de Phil Spector em Let it Be, que foi reeditado muito mais tarde sem a parede de som de Spector mas nem por isso melhorou.

Fernando Proença

 

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