Caloiros e professores desesperam na procura de casa

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Numa altura em que o Algarve e todo o País sofre um problema de falta de habitação, os caloiros e os professores colocados na região desesperam à procura de quatro paredes para dormir, estudar e trabalhar. Com muita procura e pouca oferta, os preços aumentam de ano para ano e já deixam questões no ar dos universitários e dos docentes: valerá a pena estudar ou trabalhar no Algarve, com todos os custos associados?

Os preços pelo aluguer de um quarto, para estudantes universitários, podem ir desde os 200 até aos 550 euros em cidades como Faro, Portimão, Loulé e Silves, segundo uma pesquisa realizada pelo JA através de diversas plataformas online.
As redes sociais são, nos dias de hoje, outra ferramenta utilizada para a procura de quarto, mas tal como foi observado pelo JA, há mais procura do que oferta, nomeadamente nos grupos de Facebook. No Instagram, é através das storys que os jovens estudantes e os seus pais procuram por um quarto.
Em Faro, a capital do ensino superior no Algarve, alugar um quarto pode custar desde 200 até 390 euros, com ou sem despesas incluídas, além de possível caução. Naturalmente, cada quarto e cada casa têm condições distintas, estando disponíveis e integrados em apartamentos com tipologias de T3, T4 e T5.
Por exemplo, um quarto num apartamento de tipologia T3 pode custar entre 250 e 350 euros, enquanto num T4 tem um valor de 320 euros e de 350 euros num T5.
A distância da Universidade do Algarve (UAlg), dos serviços e dos transportes pode contribuir para a variação dos preços, tal como a falta de acesso a elevador, partilha de quarto ou ausência de sala de estar e janelas.
Já na zona das Gambelas e do Montenegro, mais perto do outro campus além da Penha, há disponibilidade de quartos com valores entre os 230 e os 450 euros. Um quarto numa casa com quatro divisões pode custar entre 250 e 325 euros.
Na Praia de Faro, um local de eleição para muitos alunos do programa Erasmus, uma casa com três quartos pode ser alugada por 800 euros.
Em Portimão, onde fica localizado outro campus da UAlg e o Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes, o preço por quarto pode ir desde os 200 aos 550 euros, enquanto um “raro” T0 custa 380 euros ou um quarto partilhado vale 250 euros.
Um quarto num T2 pode custar entre 350 e 380 euros, enquanto num T3 vale entre 290 e 550. Ja num T4 existem valores desde 240 a 350 euros.
Em Loulé e Silves, onde os alunos podem ingressar no Instituto Superior D. Afonso III e no Instituto Piaget, respetivamente, a oferta de quartos para alugar é muito menor comparada com Faro e Portimão.
Um quarto em Loulé ou Silves pode custar entre os 220 (partilhado) e os 500 euros, inserido numa habitação de tipologia T3.

“Não foi muito fácil”
Inês Conceição, natural de Monte Gordo, no concelho de Vila Real de Santo António, é caloira do curso técnico superior profissional de Segurança e Higiene Alimentar do Instituto Superior de Engenharia da UAlg e começou a procurar quarto “depois de saber os resultados das colocações”.
No seu caso, Inês Conceição, com 19 anos e que terminou há meses o ensino secundário, optou por alugar um quarto apesar de ter preferência por alugar “uma casa com pessoas conhecidas” e “o mais próximo possível da universidade”.
“A experiência não foi muito fácil, até porque é muito complicado arranjar um quarto com boas condições e a bons preços”, refere ao JA.
A procura começou através de grupos de Facebook, em websites como o Bquartos ou o Idealista e através de alguns contactos que pessoas próximas lhe transmitiram.
Em relação a preços, a nova aluna da UAlg revela que “variam entre os 250 e os 400 euros” e que, “em alguns casos, os valores são um pouco elevados para as condições que oferecem”.
“Por exemplo, um quarto muito pequeno, com mobília antiga, cozinha com pouco espaço e móveis que não aparentavam bom estado, sem sala de estar, num quarto andar sem elevador, o senhorio pedia 280 euros com caução. Claramente que não tinha o preço mais adequado”, explica.
Com alguma sorte, a vilarrealense acabou por ficar com o único quarto que visitou, pois “a casa tinha boas condições, uma sala e cozinha amplas, uma boa casa de banho e um quarto espaçoso”.
No entanto, a aluna considera que a UAlg e a associação académica deveriam “aconselhar plataformas ou locais de pesquisa, partilhar contactos e anúncios nas redes sociais”, para facilitar a vida aos alunos nesta busca por um sítio para dormir, que por vezes pode ser complicada.

Fábio Zacarias, presidente da AAUAlg

Estudantes colocados, estudantes desalojados
O atual presidente da Associação Académica da UAlg, Fábio Zacarias, disse ao JA que “temos os estudantes colocados, mas temos os estudantes desalojados”.
“A oferta diminuiu e a procura aumentou, tal como os preços. É uma disparidade que não se justifica. Há cinco ou 10 anos atrás tínhamos o preço de um quarto em Faro entre os 100 e os 170 euros e neste preciso momento estão entre os 300 e os 400. Ou seja, é completamente insuportável para um estudante que venha para Faro, com as dificuldades financeiras que foram criadas pela pandemia, aumentarmos a taxa de esforço de um aluno para vir para o Algarve é muito complicado”, explica.
Apesar da UAlg ter anunciado há algumas semanas novas obras e a construção de novas residências para estudantes de ensino superior, Fábio Zacarias conta que duas das estruturas “vieram com o processo indeferido, ou seja, não estamos a aumentar consideravelmente ou o necessário o número de camas que necessitamos no Algarve”.
Para tentar resolver este problema, a associação académica refere que está a “trabalhar junto das pessoas que têm quartos para alugar” e através do “programa que o município de Faro está a utilizar, “Faco Acolhe”, que pretende colocar estudantes na casa de pessoas com idade mais avançada”.
No entanto, “se efetivamente não existirem medidas por parte do Governo central e um aumento do investimento neste setor, vai ser muito complicado” no futuro.
“Há muito tempo que o movimento estudantil tem vindo a debater esta questão da habitação, mas de facto aquilo que está a ser feito e o investimento que vai haver é que maior parte das novas camas será aplicado nas áreas de Lisboa e do Porto. Então e as regiões periféricas fora dos grandes centros urbanos? Como é que nós podemos potenciar o desenvolvimento de Portugal no seu todo se não investimos na regiões onde estão outras instituições de ensino superior? Aqui no Algarve, principalmente, com a taxa de sazonalidade altíssima, não faz qualquer sentido não investirmos aqui”, questiona.
Atualmente, os novos alunos “estão a procurar em todo o lado” mas “podem vir a acontecer casos como já aconteceram no ano passado, com alguns estudantes que são colocados na primeira fase, não conseguem arranjar casa e candidatam-se à segunda fase e vão para outra instituição de ensino superior”.
“Aquela que é a estratégia de fixar jovens na região vai completamente por água abaixo porque nós não temos condições para os receber”, acrescenta.

UAlg: Paulo Águas toma posse como reitor esta semana
Paulo Águas, reitor da UAlg

UAlg não transforma salas de aula em camaratas
O reitor da UAlg, Paulo Águas, confessou ao JA que esta problemática da habitação dos alunos “é uma situação que preocupa” mas “não consegue transformar salas de aula em camaratas”.
“A universidade está atenta e tentará ajudar os estudantes, mas não somos promotores imobiliários e temos um conjunto de 550 camas que irão estar todas ocupadas, que têm de ser prioritariamente destinadas a estudantes deslocados bolseiros”, começou por dizer o reitor.
Paulo Águas afirmou ao JA que “os estudantes bolseiros deslocados da UAlg têm todos alojamento garantido nas residências” mas “a maioria não são bolseiros” e aí não se consegue encontrar uma solução, apesar da UAlg ter assinado, há dois anos, um protocolo com a Santa Casa da Misericórdia que transformou um equipamento em residência de estudantes, com mais 12 ou 15 camas.
“Hoje em dia a procura do alojamento faz-se em plataformas informáticas e a UAlg nunca assumiu constituir qualquer base de dados de alojamento, até porque a maior parte pessoas não adere. Há alguns anos atrás a associação académica lançou esse desafio, no sentido de termos quartos para indicar aos estudantes, mas não houve adesão. De uma forma muito pragmática é uma questão de procura e oferta e os estudantes vão ajustando”, explica.
Apesar de estar prevista a construção de novas residências para estudantes, “esses novos equipamentos não estarão prontos para os alunos que iniciam agora as aulas”, mas o reitor espera que “haja muita resiliência por parte dos estudantes”, acreditando que “progressivamente, se vão acomodando”.
“Nós temos informações de pessoas que conseguem alojamento em Faro, mas só a partir do início de outubro, tal como existem estudantes que agora estão em casas provisórias e infelizmente mais dispendiosa e que depois ajusta no futuro. É uma situação que nos preocupa imenso, mas acho que os estudantes e as famílias compreendem”, refere ao JA.
O reitor explica ao JA que existem “testemunhos de pessoas que não conseguiram suportar os custos, mas há várias situações: há aqueles estudantes que já tinham quase a certeza de que vinham para a UAlg há um mês e começaram a procurar quarto com alguma antecedência. Depois há aqueles estudantes que a sua nota de candidatura poderia não permitir a entrada e não foram à procura de alojamento e aguardaram pelos resultados”.
“Essas são as situações mais críticas, sendo que o estudante que tenha mais dificuldades ou seja bolseiro, nós conseguimos respostas imediatas, até em alguns casos provisórias, porque nem todos os estudantes chegam ao mesmo tempo e temos camas para bolseiros que chegam mais tarde mas que podem ser ocupadas provisoriamente durante uns dias enquanto procuram alojamento”, garante.
O reitor relembra que “as dificuldades que Faro está a sentir são as que estão a ocorrer em todo o País” e que “se o estudante tiver de se deslocar para Faro, Évora, Lisboa ou Coimbra, o aluno vai ter dificuldades muito semelhantes”.
“Todos nós sabemos qual é o preço do alojamento no Algarve, porque no fundo isto não é só caro para os estudantes. Um residente no Algarve suporta custos de alojamento muito mais elevados do que noutra zona do País”, acrescenta.

Rendas altas e pouca oferta são um dilema para professores na região

Os elevados preços e a limitação dos contratos de arrendamento a nove ou 10 meses são as maiores preocupações dos professores que anualmente são colocados nas escolas do Algarve.
Os professores que concorrem para escolas fora das suas áreas de residência, na esperança de conseguirem três contratos anuais consecutivos completos que lhes permitam entrar para os quadros, confrontam-se todos os anos com preços elevados e pouca oferta de arrendamento numa região que é eminentemente turística.
“A maioria dos arrendamentos que estão a ser praticados no Algarve são incomportáveis para os professores que concorrem para a região, agravado pelo facto de muitos senhorios limitarem os contratos até junho”, disse Lídia Fernandes, professora colocada este ano numa escola de Quarteira.
A docente de 41 anos, oriunda de Ponte de Barca, no distrito de Viana do Castelo, colocada no Algarve pelo terceiro ano consecutivo, voltou a enfrentar o “dilema” de encontrar casa, depois de terminado o contrato do apartamento que tinha arrendado até ao mês de junho.
“Este ano consegui um apartamento em agosto, mas com a condição de entrar apenas no meio do mês de setembro. Significa que tive de andar a pedir a colegas para me deixarem dormir nas suas casas, até que pudesse entrar para o apartamento”, referiu.
A procura e mudança constante de casa no final de cada ano letivo “mexem muito com a vida dos professores, fazendo com que andem com a casa às costas todos os anos, mesmo sabendo que podem ficar no ano seguinte na mesma escola”.
“Temos de retirar tudo das casas e levar para quilómetros de distância e voltar a procurar casa. Em muitas zonas do Algarve, mesmo que nos disponibilizemos para pagar o mês de agosto ao valor acordado para os outros meses, infelizmente, não nos é permitido”, lamentou.
Segundo Lídia Fernandes, a limitação dos contratos de arrendamento a nove e a 10 meses deve-se ao facto de os “proprietários quererem ter o apartamento disponível para o arrendar durante a época do verão”.
A professora do ensino secundário adianta que a situação se agrava para os docentes que apenas são colocados nas escolas nos meses de setembro e outubro, “período em que é mais difícil encontrar casa dentro de valores aceitáveis”.
Lídia Fernandes explicou que nos anos de 2020 e em 2021 não foi colocada logo em agosto, confrontando-se com “as casas que sobravam no mercado com rendas a partir dos 450 euros mensais, acrescido das despesas fixas de água, luz, gás e internet”.
“São valores incomportáveis para um ordenado de professor, tornando-se cansativo, porque é uma reorganização da vida todos os anos”, apontou.
Também Nicole Esteves, colocada há dois anos em Aljezur, disse que se confrontou “com a fraca oferta e com os preços altos” no mercado de arrendamento algarvio, onde os alojamentos disponíveis chegam a atingir os 800 euros mensais.
“São rendas elevadíssimas, nada acessíveis aos professores, numa localidade onde a oferta é muito limitada”, referiu. Depois de no ano passado ter tido dificuldade em encontrar uma habitação “com uma renda razoável, mas com duração até julho”, este ano foi mais fácil, por ter sido colocada em agosto, “mas ainda assim com uma renda nada simpática”.
Outros professores disseram que a única alternativa que têm para enfrentar os preços do arrendamento praticado no Algarve “é a partilha de casa com outros docentes”.
Nessa situação está Carla Gomes que partilha, há dois anos em Portimão, um T2 (apartamento com dois quartos) “com outra colega, numa habitação com contrato renovável anualmente”.
“É uma renda elevada, 800 euros mensais, e só dividindo a casa é que se consegue suportar a despesa”, concluiu.

O problema da mobilidade, para além do alojamento

O presidente da associação académica da UAlg, Fábio Zacarias, destacou ainda outro problema atual: não existe uma oferta de mobilidade “que consiga fazer com que os estudantes possam ficar alojados nas cidades periféricas às cidades onde estão localizados os campus da UAlg.
Dentro da cidade de Faro não existem muitos problemas, “uma vez que também existem ligações com o campus das Gambelas de 15 em 15 minutos”, mas o problema é que “só considerarmos que um estudante é um aluno deslocado a partir dos 50 quilómetros de distância da sua área de residência até à zona do campus universitário”.
“A realidade é que um aluno que estuda em Faro e vive Vila do Bispo, demora mais tempo da sua cidade à capital algarvia do que se calhar de Faro a Lisboa. Isto é que não pode acontecer. Um estudante de, por exemplo, Aljezur, que vá para Portimão, se quiser ficar em casa para estudar não tem oferta de mobilidade que consiga ir e chegar a tempo às aulas e ainda voltar para casa no mesmo dia”, explica.
Fábio Zacarias aponta o dedo aos últimos governos portugueses: “Ouvimos constantemente que vai melhorar, que a linha do comboio vai ser eletrificada e que vão aumentar o número de camas mas efetivamente todos os anos o problema é o mesmo”.

Alargada rede de transportes para a UAlg
Como a chegada no novo ano letivo, a VAMUS Algarve comunicou, na semana passada, o reforço da oferta de transporte entre a cidade de Olhão e a UAlg, linha que já está a funcionar desde o dia 19 de setembro.
A nova linha 69 “Olhão – Universidade do Algarve” vai facilitar a vida aos universitários que vivem em Olhão, garantindo um transporte direto entre aquela cidade, o campus da Penha e o campus das Gambelas com 11 circulações diárias.
Este serviço servirá ainda o Hospital de Faro, o Fórum Algarve e o Hospital de Gambelas.
Segundo a empresa, será ainda um incentivo à utilização da nova linha a existência do passe mensal SUB_23, que irá custar 24,50 euros para todos os estudantes e 13,05 euros para os alunos que usufruam de ação social direta (bolsa de estudante) para viagens ilimitadas.
Também a linha 56 “Aerobus” manterá o seu serviço à Universidade (Campus Gambelas) desde Lagos, Portimão, Lagoa e Albufeira.
Em comunicado, a VAMUS Algarve diz que está ainda “a estudar a possibilidade de criar uma rota direta entre Vilamoura, Quarteira, Almancil e a Universidade e Aeroporto”.
Para aqueles que não utilizam a app VAMUS Algarve para recarregar o seu passe ou cartão pré-pago, a empresa explica que basta dirigir-se “aos terminais rodoviários e quiosques automáticos”.
Em outubro, está ainda prevista a abertura do novo posto de vendas da VAMUS no centro comercial Fórum Algarve, em Faro.

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