Um pontifício “cartão vermelho”
Novos casos de utilização indevida de fundos públicos “salpicam” a classe política:
– Milão – 64 conselheiros regionais da Região Lombardia estão a ser investigados pela Guardia di Finanza, suspeitos de terem gasto indevidamente fundos regionais. Dois milhões e meio de euro foram gastos em restaurantes e “compras várias”. Esmiuçando a rúbrica “compras várias”, os investigadores encontraram despesas anómalas, como 12,10 euros em aspirinas, ou 2,70 euros num boião de “nutella” ou 2.190,29 euros em caviar. Mas também há televisores de última geração e “smartphones”.
– Nápoles – 55 políticos, entre Conselheiros da Região Campânia e parlamentares regionais vão a julgamento, acusados de uso ilícito de fundos regionais num total de 2 milhões de euro. Há despesas em cabeleireiro, brinquedos, botijas de gás e até pagamento de impostos. Para muitas das despesas, os investigados, não souberam dar uma explicação plausível.
– Génova – numa sessão de câmara, não havendo número legal de presenças, o presidente fechou a sessão que durou 9 minutos e os membros presentes receberam – legalmente – 98,00 euros (senha de presença) cada um.
Mas o mal é geral… Em Espanha, mais propriamente na Andaluzia, a Justiça investiga uma teia de corrupção de dimensões gigantescas denominada “la trama de los ERE”, de onde se calcula tenham sido desviados mil e duzentos milhões de euro dos fundos destinados a subsídios de desemprego e formação profissional. O último balanço do processo revela o envolvimento de 143 indivíduos, dos quais 27 são altos cargos da Junta da Andaluzia, tendo o Supremo enviado às Cortes (Parlamento) os autos de preimputación de Manuel Chaves e António Griñan, ex-presidentes da referida Junta. As verbas eram desviadas com subvenções fraudulentas e financiamentos de empresas fictícias.
E por cá… o ex-diretor geral de Infraestruturas e Equipamentos do Ministério da Administração Interna João Alberto Correia é detido por suspeitas de corrupção e participação económica e fica em prisão preventiva.
[…] a homilia pronunciada há dias pelo Papa Francisco perante cinco centenas de políticos que o escutavam na missa celebrada em São Pedro (já referido na “C+f” de 10.IV.2014) na qual o Pontífice criticou frontalmente e com dureza a corrupção na política italiana, causou grande alvoroço. Entretanto os visados (os políticos), perante semelhante “cartão vermelho”, em vez de aproveitar a ocasião para fazer ato de contrição, mantiveram-se aprumados e distantes, “embalados” nos seus fatos armani, valentino ou versace feitos por medida para a ocasião, como se envergassem uma couraça de impunidade. Aquelas críticas veementes, pronunciadas pela mais alta hierarquia da Igreja, rossaram por eles como gotas de chuva a deslizar numa chapa de lata “come le loro faccie” (como as caras deles). Reagiram com hipocrisia, como se aquele anátema lançado pelo Sumo Pontífice tivesse sido dirigido aos habitantes de uma galáxia perdida nos confins do Universo e não à sua classe (a eles).
A sua atitude recorda-me um episódio que narra as vicissitudes de um explorador perdido na selva amazónica em companhia do seu guia. A certa altura o guia admitiu que se havia perdido – não sabia onde se encontravam. O explorador desesperado perante a terrível situação causada pela incompetência do seu guia gritou-lhe: – «És um cretino!…». Ao que o guia, com um ar cândido, olhando para um e outro lado respondeu: – «Isso é comigo?»
Será que os políticos, perante as palavras do Papa, também se interrogam: – «Isso é comigo?…»
P.S.: – O endividamento da CM de VRSA em 31.12.2012 aumentou 2,323 milhões em relação a 1.01 do mesmo ano e entretanto declaramos que: «está finalmente cumprido um dos principais objetivos deste executivo…». «Com este financiamento, honraremos uma importante fatia dos compromissos há muito assumidos…».
Durante anos vivemos acima das nossas possibilidades, gastando no essencial e esbanjando no supérfluo e contraindo débitos milionários. Agora transformámos o débito de curto em longo prazo e contraímos empréstimos que hipotecam – pelo menos – uma geração de Cidadãos. No entanto, quando escutamos/lemos as declarações dos nossos Responsáveis, parece que falam de débitos e compromissos herdados de um outro executivo e não do “caos” provocado pela sua perdularia gestão, e como se perguntassem: – «Isso é comigo?…»
…Enfim! Penso que teria sido uma boa oportunidade para fazer mea culpa…
«Errar é humano. Perseverar é burrice.»
Luigi Rolla
