CARLOS ALBINO

 SMS

Sua Excelência o Residente da República

 

Há uns meses atrás, aqui neste mesmo espaço, sem querer fazer trocadilho, levantei a questão de que o tempo se encarregaria de demonstrar se Cavaco Silva, eminente estadista português, filho do Algarve, iria passar à história, nesta sua última fase, como um Presidente da República honorável ou um simples residente do palácio Cor de Rosa. Ora, Infelizmente, à medida que os dias passam e o País mergulha numa crise que parece incontrolável, o Presidente da República mostra-se incapaz de garantir aos portugueses que o papel de um presidente, no actual regime, é uma figura indispensável. Pelo contrário, para desgosto tanto dos seus apoiantes quanto dos seus detractores, a sua figura tornou-se, desde há uns bons meses, clamorosamente dispensável. O seu isolamento em face do país, das suas urgências, conveniências e aflições, tornou-se clamoroso. É triste mesmo que até os menos críticos comecem apreciações sobre os procedimentos do actual presidente, dizendo que não querem ser demasiado cruéis. E assim, Cavaco Silva, dia após dia, desgasta gravemente, a sua imagem pública. Isto é, não serve como deveria o país que jurou servir e ao qual se ofereceu como seu garante de unidade máxima.

 

Ninguém o constata com felicidade, e talvez valha a pena lembrar que a ideia de que o chefe de um estado representa um povo, e que perante ele responde, é tão antiga quanto a ideia de estado. Esse conceito, na antiga Grécia está na base da concepção da Tragédia Grega, século V antes de Cristo, e vem até aos nossos dias. O texto admirável de Milan Kundera que é “A Insustentável Leveza do Ser”, escrito nos anos oitenta, fala exactamente do aspecto decisivo da representação. Nessas páginas, o escritor checo demonstra como a fragilidade e a anomia dos chefes derramam a sua ineficácia e a sua omissão em cadeia, desde o topo até à base de uma sociedade, quer ela seja ditatorial quer seja livre.

 

Assim, quando um Presidente da República é grande, generoso, aberto e magnânimo, é toda a sociedade que se eleva. Eleva-se a ele mesmo, eleva as instituições do regime, o partido de onde provém, aqueles que o elegeram, os que não o elegeram, a sua família política, e eleva a sua cidade, a sua província, ou a aldeia que o viu nascer. Mas se assim não é, se um presidente se apouca, foge, não passa de um estratega escondido, de quem se sabe traços da vida privada, mas não se conhece grandeza na vida pública, é o partido de onde provém que se diminui, e diminui a sociedade, as instituições, a sua família política, e a sua terra. Escrevo esta crónica, precisamente, na terra que viu nascer Cavaco Silva e como tal o tem reconhecido. Escrevo com muita pena.

 

A minha pergunta, escrevendo para este 4 de abril, é esta – Será que os dias de amanhã conseguirão dar-nos já, nem digo uma boa notícia, mas uma qualquer notícia que nos honre? Uma notícia que eleve a Residência à categoria de uma necessária Presidência da República? Ou será que um homem nascido na nossa terra, oriundo como nós, dos nossos montes agrestes, se quer tornar num monarca espanhol, presente nas caçadas, mas indiferente aos milhões que, cada dia, perdem o direito ao pão?

 

 

Flagrante instituição: Faz o Jornal do Algarve 56 anos. Que dure enquanto o Guadiana e o Arade durarem como rios, porque mal ficará o Algarve se secarem.

 

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