Ecofin pode não chegar a consenso sobre a Grécia

ouvir notícia

Divergências entre o re-profiling da dívida grega defendido pelos alemães e o “não” a um “default seletivo” afirmado pelo presidente do Banco Central Europeu põem em causa o segundo pacote de resgate a Atenas. Um grupo de trabalho foi criado no Eurogrupo para limar as arestas até dia 20 de junho

As divergências sobre as condições a colocar à Grécia no âmbito de um segundo pacote de resgate estalaram publicamente com ruído esta semana.
O ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schauble, em carta aos seus colegas europeus defendeu a ideia de envolvimento dos credores privados (bancos e fundos) da dívida grega no esforço de refinanciamento grego. A proposta seria conseguir €30 mil milhões numa troca de títulos que alargasse a maturidade em mais 7 anos.

Mas o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, ripostou claramente com um “não” . “Nem evento de crédito, nem default selectivo”, disse em conferência de imprensa em Frankfurt por ocasião da divulgação da decisão de não mexer nas taxas de juro. Interrogado pelos jornalistas foi taxativo: “Não é certamente a nossa intenção [fazer o roll over dos títulos gregos detidos pelo BCE]”.

- Publicidade -

Ser ou não ser “voluntário”

A iniciativa de troca voluntária de títulos poderia desencadear um evento do tipo da falência do Lehman Brothers em 2008. Trichet insistiu, por isso, no caminho dos resgates com alternativas ao envolvimento dos credores privados, como, por exemplo, a aceleração das privatizações e a atração de investimento direto estrangeiro.

O presidente do BCE tem do seu lado o seu sucessor Mario Draghi, os franceses e as agências de rating. A Fitch disse que um re-profiling nas circunstâncias atuais não seria “voluntário” e que baixaria, por isso, a notação da dívida grega. Ameaçou, ainda, que “revisitaria” as notações dos outros países periféricos, pois uma reestruturação “suave” – como vem defendendo o presidente do Eurogrupo e parece ser agora doutrina oficial alemã – num país membro da zona euro seria interpretada como mudança de política da União Europeia. A Moody’s reforçou esta posição.

O comissário europeu Olli Rehn, por seu lado, sugeriu a ideia de se adaptar a “Iniciativa de Viena” usada no leste europeu, que envolveu uma participação voluntária dos credores. O Memorando de Entendimento português já contém essa disposição. Por seu lado, António Borges, diretor do FMI para a Europa, identificou um valor potencial de ativos gregos privatizáveis que chegaria aos €200 mil milhões, muito acima dos €30 mil milhões programados. Uma das ideias em curso é que o novo empréstimo seja colateralizado com esses ativos.

A agência Eurointelligence arrisca que, com divergências tão claras, um acordo na reunião do Ecofin de 20 de junho sobre o segundo pacote de resgate à Grécia poderá estar em causa. O que implicaria uma pesada noitada na cimeira europeia de 23 e 24 de junho e negociações duras para um compromisso.

Janela estreita de compromisso

Para preparar o terreno de negociação, o ministro alemão Wolfgang Schauble anunciou que um grupo de trabalho dentro do Eurogrupo, com a participação da troika, irá tentar encontrar “uma janela estreita” entre as posições alemãs e a negativa do BCE.

O que está em jogo é um pacote adicional de €120 mil milhões envolvendo €60 mil milhões de empréstimos da troika para o período de 2012 a 2014. Na totalidade, a Grécia disporia de €180 mil milhões, pois há um saldo de €57 mil milhões por usar do primeiro pacote lançado em maio de 2010.

O relatório da troika divulgado esta semana pelo Der Spiegel traça um balanço negativo da aplicação do plano de maio de 2010: a Grécia terá uma recessão de 3,8% este ano (depois de uma contração de 4,5% em 2010); o défice orçamental permanecerá próximo do valor do ano passado (10,5% do PIB); a dívida pública atingirá um pico em 2012/2013; o desemprego chegou aos 16,2% com 42,5% de desempregados na população jovem; o Tesouro grego não conseguirá financiar-se no mercado em 2012, conforme inicialmente estava previsto no acordo do primeiro resgate, o que agora é considerado “um cenário muito remoto”.

E conclui muito claramente: “O próximo pagamento [a 5ª tranche do plano de resgate de maio de 2010 que envolveu €110 mil milhões] não poderá ser feito antes que a situação de subfinanciamento seja resolvida”.

As condições políticas colocadas pela troika para um consenso alargado, também, não se concretizaram. O líder Antonis Samaras, da Nova Democracia (o partido no governo até 2009 que deixou por herança uma situação de pré-bancarrota), continua a não dar o “sim” ao plano de austeridade, reclamando cortes nos impostos, o que o próprio relatório da troika considera “irrealista” e “incompatível com os objetivos do programa de ajustamento”. Em Atenas corre o rumor de que o governo do PASOK (socialistas) poderá amaciar as posições da oposição de direita cedendo a algumas reivindicações num novo pacote de impostos em setembro.

Recorde-se que os estatutos do FMI proíbem qualquer empréstimo se houver dúvidas de que o país possa entrar em default num horizonte de 12 meses.

Plano de austeridade grego

O governo de Atenas colocou no Parlamento uma proposta de Plano de Austeridade e de Privatizações para 2012 a 2015 que suscita inclusive oposição interna dentro do PASOK e a reclamação de remodelação, nomeadamente do ministro das Finanças, uma das peças-chave do atual primeiro-ministro. No campo da Função Pública, o corte passará por uma redução de 150 funcionários num total de 700 mil, e será adotada a regra de contratar 1 novo funcionário por cada 10 que saiam.

O pacotão de impostos implica: um imposto extraordinário sobre os rendimentos de 2 a 4% com efeitos retroativos aos de 2010; o imposto sobre imóveis passar a vigorar acima de um património avaliado em €200 mil euros; um imposto especial sobre veículos de alta cilindrada; o aumento do IVA para a restauração no sentido de aplicação da taxa máxima.
Jens Bastian: 5 áreas de prioridade

Para o economista da Fundação Eliamep em Atenas, o atual quadro assinado em maio de 2010 revelou-se “irrealista na substância e excessivamente otimista na previsão do regresso da Grécia aos mercados em 2012”. Por isso propõe 5 áreas de revisão no Memorando de Entendimento (MoU):

– Ajustamentos que aliviem o fardo da dívida, evitando uma reestruturação desordenada;

– Um compromisso por parte das empresas de que o aumento dos lucros privados deverá ser reinvestido;

– Apoio à exportação em todas as vertentes (a nível fiscal; crédito de financiamento; regulamentação da inovação);

– Um “Plano Hércules” por parte dos fundos europeus, com uma suspensão temporária da obrigatoriedade das comparticipações nacionais, e com apoio adicional do Banco Europeu de Investimento;

– Acordos dentro do veículo financeiro europeu FEEF (EFSF, no acrónimo em inglês, para Fundo Europeu de Estabilização Financeira) para dar mais tempo à Grécia para conseguir colocar a dívida numa trajetória sustentável.

JA/Rede Expresso
- Publicidade -
spot_imgspot_img

Deixe um comentário

+Notícias

Exclusivos

Deixe um comentário

Por favor digite o seu comentário!
Por favor, digite o seu nome

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.