Falta de trabalhadores é o maior problema do turismo do Algarve

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João Fernandes salientou que a falta de recursos humanos tem, atualmente, efeitos mais negativos na atividade turística do que a pandemia e a guerra na Ucrânia juntas. E que esse é o verdadeiro “nó górdio” do Turismo da região, que está carente de mão-de-obra estrangeira

Falando aos jornalistas à margem do programa oficial da BTL, que terminou no passado domingo, o responsável máximo pela promoção turística da região salientou que “o ‘nó górdio’ que temos pela frente diz mais respeito aos recursos humanos do que a pandemia ou a guerra, porque esse sim é um problema estrutural”.

“Há cada vez menos jovens para mão de obra. Já não conseguimos trazer população do Alentejo, do Centro, do Norte, regiões que têm já turismo e fixam esses ativos. Há cada vez menos jovens a abraçar atividades operacionais, é legítimo, são mais qualificados. A solução é trabalhar com a imigração”, acrescentou.


“Temos um bom nível de procura [no Turismo da região], não são os impactos da guerra que são mais significativos.

Do ponto de vista da pandemia, ainda no dia 18 o Reino Unido decretou que qualquer regra que restringisse as viagens seria abolida, o que é uma situação já muito diferente da que já existiu”, disse.


No entanto não deixou de relevar os efeitos cumulativos da nova situação geopolítica na Europa com a falta de recursos humanos para o Turismo, ao sustentar que “quando há uma crise, a imigração, que muitas vezes nos ajuda a suprir estas necessidades de mão-de-obra, volta aos seus países e com o processo de regresso em 2022 é muito difícil de conseguir o volume de gente de que precisamos para trabalhar”.

Ainda é cedo para saber consequências da guerra


Sublinhando que as maiores necessidades são nos setores mais operacionais – de cozinheiros a empregadas de andares, por exemplo – Fernandes afiançou que, logo no início da guerra, a 24 de janeiro, a RTA começou a trabalhar com o IEFP para direcionar refugiados da Ucrânia para o setor.


“E estão a crescer essas ofertas, trabalhámos com o setor para saber qual o perfi, mas temos que nos lembrar que quem foge de uma guerra primeiro precisa de conforto, segurança e legalização. Até porque muitos vêm com dependentes a cargos, idosos ou crianças e precisam de respostas sociais. Alguém que tem os filhos menores a cargo não pode ir trabalhar. Nem sequer a paz de espírito, uma habitação, tempo para se organizar”, precisou, salientando que a Ucrânia tem uma boa qualidade de recursos humanos direcionados ao setor turístico, além de o Algarve constituir a segunda maior comunidade daquele país em Portugal, a seguir a Lisboa.


Sobre os efeitos da guerra nos fluxos turísticos para o Algarve o presidente da RTA reconhece que ainda não se fizeram sentir os desvios desses fluxos nem os seus sentidos, embora haja sinais exteriores: “Sentimos por exemplo que a Turquia ou a Grécia estão a enfrentar dificuldades em alguns mercados pela proximidade com o conflito. Mas no que nos diz diretamente respeito não sabemos qual será o impacto da guerra nos nossos mercados emissores e como o consumidor se vai comportar face a um aumento de preços na viagem e na estadia e a uma expetativa de passar por uma nova crise”.

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No entanto, afiançou que, apesar do conflito e mesmo da pandemia, “o que temos em carteira de reservas é muito animador”.


No que respeita à pandemia, frisou os benefícios da fluidez do mercado, já que hoje a possibilidade de desmarcar a viagem e a estadia é hoje muito mais ágil”.

Cinco anos “de ouro” até 2019


Sobre a atual situação no mundo das reservas, salientou que, apesar do mundo de incógnitas de que é feito o mercado turístico europeu e mundial, devido à pandemia, à guerra e ao contacto económico, e de tudo se poder desmoronar com algum fator imponderável, havia a perspetiva de em 2023 chegarmos a patamares de procura semelhantes a 2019, depois de dois anos menos bons. “Certo é que estamos com reservas muito elevadas em carteira, por exemplo no golfe, de março a maio e mesmo para a Páscoa e o Verão”.


“Só que todos sabemos que há uma nuvem que paira sobre a Europa e o mundo e cujos impactos ainda temos dificuldade em estimar. Quais os efeitos que terá em mercados como a Finlândia, que está junto à Rússia, ou a Suécia, com o seu estatuto neutral muitas vezes posto em causa? Ou a Polónia, ou a Alemanha, país em que o consumidor antecipa as crises económicas, retraindo-se no consumo. Haverá desvio de fluxos que nós estamos no extremos oposto da Europa em relação ao conflito. Até que ponto vai o aumento de preços dos bens e serviços que são fornecidos à cadeia de valor do turismo? Quão caras ficarão as viagens?”.


Um mundo de questões ainda sem respostas e dependentes da evolução geopolítica, económica e até sanitária, avaliadas praticamente dia-a-dia.


De resto, na apresentação que fez acerca do balanço e da promoção do turismo algarvio para os próximos meses, João Fernandes enfatizou a evolução de que o setor foi protagonista entre 2015 e 2019, nunca perdendo de vista que em 2023 poder-se-ia retomar esse trilho virtuoso caso as condições exógenas o permitissem.


“A evolução entre 2015 e 2019 demonstra a capacidade que tivemos de gerar procura e sobretudo gerar essa procura fora da época alta”, afirmou, precisando que no quinquénio de 2015 a 2019 o setor reduziu a sazonalidade em 3,3 pontos percentuais.


“Partimos de 46,4% em sazonalidade e reduzimos para 43,1%, com quedas ano após ano. Quando olhamos para janeiro e fevereiro de 2020, os meses imediatos, antes da pandemia, estávamos a crescer 15,3% em hóspedes no Algarve, no pico da época baixa. Portanto, não há que rever essa aposta, há que melhorá-la”.


Aduziu que aumentar em volume de turistas é muito importante mas importante é também captar mais riqueza para a região. E enunciou que, neste quesito, os proveitos financeiros aumentaram 12,4% no mesmo ciclo de 2015 a 2019. “Mas dirão que podia ser apenas porque a oferta aumentou. Não foi, porque quando vamos ver a comunidade de negócio temos um crescimento inferior, de apenas 8,6%”.

Mercados emissores alargaram-se


Garantindo que a atual liderança do Turismo do Algarve não quer “os ovos todos no mesmo cesto”, isto é, os mesmos mercados emissores ano após ano, João Fernandes trouxe também boas notícias no resumo que fez do quinquénio em questão: “Diversificámos de tal forma os nossos mercados emissores que, não perdendo os primeiros cinco mercados (crescemos 15% em dormidas, portanto não perdemos nos principais mercados), crescemos nos restantes 73. Podem dizer que são mercados pequenos, que não é tão interessante, mas não: o ”top 5” teve 2 milhões de dormidas e o volume de dormidas foi também superior a 2 milhões nos restantes mercados”.


Acentuou que é necessário continuar a diversificar a oferta e que já existem mercados emergentes com grande dimensão: exemplificando, precisou que a França cresceu 112% naqueles cinco anos, os EUA 210%, Itália 210% e o Brasil 332%.


“E se olharmos para os valores absolutos, o crescimento destes pequenos mercados é superior à queda que tivemos num grande mercado como a Holanda. E foi uma queda que tivemos associada à falta de competitividade por preço.

Não podemos competir com preços baixos, esta é a aposta que estamos a fazer de diversificar mercados e criar mais riqueza”, verbalizou.


Na sua apresentação, perante algumas dezenas de pessoas que enchiam o pequeno anfiteatro da FIL dedicado ao Algarve, João Fernandes referiu-se ao mercado nacional, sublinhando que, em cada crise, há um fenómeno imutável:

“Os mercados externos retraem-se e são os mercados de proximidade que fazem efeito tampão a esse impacto de perda. O mercado nacional é extremamente importante para o Algarve, E há 40 anos seguidos que nós somos o principal destino turístico de estrangeiros que nos visitam mas também de portugueses que viajam no nosso País”.


E, ressalvou, a região turística não perdeu notoriedade nem sequer durante a pandemia: afiançou que pela 1.ª vez em 2020 fomos reconhecidos como o melhor destino de praia do mundo. “Éramos recordistas na Europa, pioneiros em matéria de segurança balnear. E fomos galardoados e reconhecidos internacionalmente pelas praias. Revisitámos a estratégia que nos deu aqueles resultados, aportando a ela novos elementos (brexit, pademia, mutações de mercados e produtos)”.

RTA, pioneira em parecerias públicas e privadas


Como lema transversal aos atores de toda a região, apontou que ela dever ser uma região turística competitiva, reconhecida pela qualidade da oferta e assente num desenvolvimento sustentável.


“E esse desenvolvimento tem todo um caminho para percorrer mas tem todas das condições para o fazer. Mitigação das alterações climáticas, eficiência hídrica, mobilidade urbana, reabilitação urbana economia circular, turismo sustentável, todas as organizações se mobilizaram para definir o que é preciso fazer com este desígnio”.


Como condição estratégica para o futuro, evocou a existência na região de um observatório de turismo sustentável, reconhecido pela Organização Mundial do Turismo, que permite “monitorizar o desempenho daquilo que fazemos e temos também instrumentos financeiros de que não dispúnhamos nos quadros comunitários anteriores. Não temos desculpas para não avançar com estes desígnios. Estamos todos convocados para este desafio”, exortou.


Admitindo que o futuro do Turismo do Algarve não passa só pelo setor público, relevou a importância das parcerias, exemplificando: “Temos como parceiros a Organização Mundial das Migrações para a migração controlada, o Governo, organismos regionais, associações locais, empresários. Todos falamos da importância das parcerias mas praticamos pouco e eu quis-vos dar uma nota clara de que a RTA faz isso com muita frequência: todos os nossos projetos têm parceiros locais, públicos ou privados de maior ou menor dimensão”.


Exemplificou com o caso da serra de Monchique, que tinha ardido em 2018: “Tínhamos projetos que já tinham planeamento mas não tinham financiamento, conseguimos trazer a Ryanair para este projeto que o ICNF tinha em carteira, com o apoio da câmara de Monchique, e volvido este tempo temos 200 mil árvores plantadas. O mesmo com o Zoomarine, Montanha Verde, a ANA e a UALG estão a reabilitar pradarias marinhas, para captura de carbono. Também convocámos privados para este desígnio”.


Parcerias que se estendem ao emprego, que tanto preocupa os responsáveis do setor: “Antes do covid já tínhamos uma parceria com a organização internacional das migrações, com o SEF e o IEFP no sentido da gestão da migração natural para empresas do setor turístico. Temos instrumentos que já são usados com sucesso no Algarve com a Rede de Países Terceiros que o IEFP desenvolve mas que o turismo ainda está a aprender a dar continuidade e resultado”.

João Prudêncio

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