O Algarve: “Oficina do Saber e do Pensar” Ultramarino

Sara Brito
Sara Brito
Docente na Pós-graduação “Segurança, Saúde e Felicidade no Trabalho”- ISEC Coimbra Mestre em Literatura Comparada; Pós Graduada em Multiculturas e Gestão de Relações Interculturais

O Algarve aparece no mapa das descobertas tendo Sagres como “oficina do saber e do pensar”, sendo aqui que o Infante D. Henrique se estabelece em 1419 e se inspira, olhando a grande esteira marítima naquele que foi o “nosso mar das descobertas”. Em 1445 parte da nossa costa o ataque de D. Afonso V a Alcácer-Ceguer.


Cento e trinta anos depois, D. Sebastião desembarca em Lagos, reúne frota e parte para África, para a fatídica batalha de Alcácer-Quibir onde viria a perecer com a fina-flor da coroa portuguesa, facilitando o posterior domínio Filipino.


O Algarve, com toda a sua extensa costa, os seus homens habituados à crespidão dos mares e à dureza das batalhas contra os mouros, com capacidade de abastecer as armadas de alimentos frescos e abundantes, possuía todas as condições para que se iniciasse a partir desta região o maior dos desafios então pensados: de Sagres e de Lagos saem as caravelas em busca dos “novos mundos”, passando os limites do conhecido face ao desconhecido, do Atlântico para o Índico. Nos séculos XV e XVI desenvolveu-se a pesca do atum e da sardinha e intensificaram-se os contactos com o litoral africano, ilhas atlânticas, Brasil, Índias de Castela, entre outros.


No entanto, o Algarve continuava com um deficit de comunicações, permanecendo isolado, afastado da metrópole e das notícias da corte praticamente até ao início do sec. XX. De Lisboa para o Algarve vinha-se de barco no verão e, no Inverno, só a cavalo pela estrada real que passava por Messines e São Marcos da Serra.


Em 1774 o Algarve volta a estar no centro das atenções da coroa. Com os cofres a ressentir-se dos excessos da expansão ultramarina, surge a necessidade de controlar a costa algarvia bem como o peixe que era capturado nas nossas águas e vendido em Espanha, não havendo lugar assim ao pagamento de impostos. Deste modo, para assegurar que os valores régios eram pagos- e para intimidarmos “nuestros ermanos” com uma cidade “iluminista” a debruçar-se sobre o Guadiana,- manda D. José I que seja erguida Vila Real de Santo António, uma cidade construída a “régua e esquadro”.


A grande origem económica da Região do Algarve, como uma espécie da primeira trave mestra para a inspiração dos tempos que hoje percorremos, torna-se marcante a partir dos finais do século XIX, com a abundância de peixe nas nossa costa, que inspiram a presença de italianos e franceses e muito mais tarde espanhóis para a industrialização das conservas de peixe. A par da força económica que vinha do mar, o Algarve partilhava outra sustentabilidade económica com origem na cortiça, frutos secos e dos citrinos.


Tudo isto, o isolamento a que foi deixado, as múltiplas influências que recebeu dos diversos povos com que contactou, a história que cá se protagonizou, como escreveu o meu querido professor Luís Filipe Oliviera, foram “razões bastantes para que a região algarvia ganhasse, por outro lado, uma identidade política própria e não viesse a ser absorvida pela expansão do reino de Portucale.” E diz mais Luís Oliveira: “Da própria consciência de viver num reino unido ao de Portugal, mas distinto dele, acabaria por resultar, também, o sentimento de pertencer a um mundo efectivamente diferente”.


Se é certo que a autenticidade de um país é feita da unidade de muitas diferenças, podemos, através destes Retalhos perceber um pouco mais da nossa identidade e singularidade enquanto habitantes periféricos de um mundo global.

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