O mau novo e o bom velho

Reli o último “Avarias” e percebi que num abrir e fechar de olhos, estamos (estou) no domínio dos textos de indignação, que é uma coisa que me aborrece. Parecia-me estar a navegar no meio de uma rede social, emoções ao alto, espingardas apontadas e uma guerra para começar. Para quem não leu (se não leu, nem sabe o que ganhou) o artigo, ou parte dele, era sobre Manuel Serrão e a hipótese de, caso se verifiquem os pressupostos que os órgãos de informação têm noticiado, poder vir a ser julgado no prazo mínimo dos próximos cinco anos.

Era mais o tom que as palavras, mas adivinha-se em mim uma cultivada animosidade (animosidade como personagem pública, se calhar o rapaz é do melhor que se encontra no mundo) sobre certo e determinado tipo de pessoas, que por acaso e só por acaso, coincidem com a ideia que sempre tive de Serrão. Estava eu então a dizer que se aproxima a quadra pascal e que com ela hão-de chegar os inevitáveis filmes de época, os sozinhos em casa (mas casa na Nazaré), que até acho muito bem, só que não os consigo perceber, falados num escorreito inglês. Não se ponham agora com ideias sobre aquela corrente que vai medrando por aí, em que actores homossexuais serão os únicos autorizados a representar o papel de um homossexual e por aí fora. Como se o acto de representar não fosse exactamente isso, representar, e também, porque não, talvez porque ser-se homossexual é de uma tal transcendência, que só pessoas capacitadas os (as), podem representar, que o respeitinho é muito bonito. E quem capacita?, pois talvez um observatório LGBT mais, elevado à potência, uma espécie de polícias da virtude (onde é que eu já ouvi isso?), como no Irão – não tão mortais nem medievais, mas mesmo assim censores, porque uma coisa é aquilo que é, deixem-se de tretas. Estava então cá o velhote a dizer que não aprecia, por exemplo, os filmes feitos só com alemães na Segunda Guerra e em que todos falam o melhor inglês de Cambridge, só para vos dar um exemplo pedagógico. Se antes falei mal das nossas telenovelas, porque todos falam lisboeta, mesmo os que sempre viveram nas brenhas do Marão, o que têm os filmes chegados do estrangeiro a mais?

Estava então eu a escrevinhar que outro dia li, num sítio (digital) que não lhes sou capaz de precisar, que referia que existe algures uma certa tendência revisionista (há tempo para tudo), sobre uma determinada forma de ver cinema e em que se encontra representada, entre outras fitas, o habitualmente menosprezado pela crítica,“Os Dez Mandamentos” (1956) de Cecil B. DeMille, com Charlton Heston, Yul Breinner, Anne Baxter e Edward G. Robinson nos principais papéis, que há maneiras de se dizer as coisas. Eu percebo bem este ir e vir das modas, mas parece-me que sim, DeMille, mais a sua obsessão pela cor e cenas espectaculares, havia de ver reconhecido a sua visão das coisas, neste tipo de filmes (multidões de figurantes, efeitos especiais a dar com um pau) que só se faz hoje com recurso ao digital, mais verosímeis, mas talvez com menos alma. E até nos esquecemos do inglês falado por hebreus da mais pura cepa.

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