ANJE/Algarve quer “task force” para fundos europeus

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Aos 38 anos, ainda a gozar o fulgor da juventude, o empresário Hugo Vieira, em entrevista ao JA, fala da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE) de que é o dirigente máximo no Algarve. Reconhece e lamenta a perda de força do movimento associativo, mas regozija-se que os jovens não precisem de ter um papá rico para ter os seus próprios negócios. Lamenta que só 20% da “bazuca” seja destinado às empresas

JORNAL DO ALGARVE (JA) – O que é que a ANJE tem feito para ajudas os empresários e candidatos a empresários no Algarve? Tem dado uma forte ajuda?
HUGO VIEIRA (HV) – Somos suspeitos quando falamos de nós próprios, mas sim. A ANJE, que fez agora 35 anos, tem ajudado os jovens empresários, quer na criação dos seus negócios quer no apoio em momentos seguintes. Há um processo contínuo de apoio, com capacitação, formação, desenvolvimento de formação à medida no apoio às empresas. E depois na internacionalização, no acesso a programas, em cooperação com a Universidade, o NERA, a ACRAL…


JA – Tem ideia de quantos jovens universitários já foram apoiados pela associação?
HV –
Não tenho. Mas nós temos diversos níveis de apoio. Por exemplo, quando um jovem quer criar a sua própria empresa e tem apoio a medidas do IEFP, por exemplo para utilização do subsídio de desemprego para a criação da sua própria empresa, e faz um plano de consultadoria, plano de negócios. Aí apoiamos. E nalgumas delas duplicamos o apoio, apoiamos também numa fase posterior.


JA – E no capítulo da formação profissional? Os jovens que vos procuram têm formação prévia e académica, ou a maioria não tem, apenas se chatearam de trabalhar por conta de outrém?
HV –
O tecido empresarial no Algarve é misto: há cada vez mais jovens licenciados. Se olharmos para quem nos pede apoio, há duas naturezas: os empresários mais jovens normalmente têm formação superior, os menos jovens (não trabalhamos exclusivamente para jovens) têm menos formação académica especializada…


JA – O que é que se considera um jovem?
HV –
Até um dia antes de se fazer 41 anos. Depois entram como “sócios arcanjos”, um belo nome que nós temos para adicionar os que passam dos 41. E têm acesso a condições especiais às nossas dinâmicas mas depois não têm algumas prerrogativas, como ser eleitos e eleger.


JA – Voltando atrás, hoje é diferente. Os jovens têm mais formação específica nas áreas de gestão e criação de empresas e os menos jovens têm menos…
HV –
Eu próprio sou um exemplo disso. Sou licenciado em engenharia e hoje sou gestor. As pessoas depois vão recorrendo a formação para ganhar novos conhecimentos e capacidades.


JA – No deve e haver destes 35 anos a associação tem crescido, nomeadamente no Algarve?
HV –
Honestamente, de uma forma geral o tecido associativo já foi mais dinâmico. Temos que dizer isto sem medos. Continuamos a ter muitos associados, muito trabalho para os associados, mas o número de associados não tem crescido de forma proporcional às atividades que desenvolvemos. Diria que hoje há associados que existem e pagam quotas mas não são tão ativos e participativos na vida associativa.


JA – Quantos associados têm?
HV –
Temos 5600 associados e no Algarve somos cerca de 600. Dez por cento do total.


JA – Está agora no segundo mandato, é dirigente da ANJE há cinco anos. Os jovens estão hoje mais ou menos empreendedores do que há cinco, dez anos atrás?
HV –
Hoje pode ser um pouco menos em virtude da pandemia e da incerteza em relação ao futuro e à crise. Pode haver um pouco menos de espírito empreendedor nesta fase mas um pouco pela questão da incerteza conjuntural.


JA – Em que áreas económicas os jovens estão a apostar mais aqui no Algarve? Na “monocultura” do Turismo ou nas startups e outras áreas diversificadas?
HV –
Cada vez mais isso é uma realidade. Os jovens empresários mais qualificados, que estão a fazer transferência de conhecimento e são apoiados pela ANJE, CRIA e NERA, estão com ideias de negócios muito alavancados pelo desenvolvimento de novas tecnologias, inovação, prestação de serviços – alguns conexos ao Turismo mas cada vez mais se está a fazer esse trabalho de diversificação do setor empresarial para uma dependência menor do Turismo. Vai demorar algum tempo.

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JA – Às vezes há a ideia de que o elevador social não funciona como seria desejável. E que grande parte dos empresários são herdeiros ou vêm de boas famílias. E que há ainda pouco quem suba na vida a pulso. Acha que isso se aplica aos jovens algarvios?
HV –
Eu acho que hoje há mais oportunidades e mais programas de apoio para que os jovens não precisem de ter um status quo adquirido, não sejam de ter um papá rico para ter os seus próprios negócios. O espírito empreendedor quando vem de um setor de atividade inovador ou com grande transferência de conhecimento está sempre muito alavancado na Universidade. E nas oportunidades criadas pelo desenvolvimento e essas novas tecnologias e essa criação de empresas, as startup. O que é uma startup? É o conhecimento adquirido por uma ou duas pessoas que consegue ser alavancado e posteriormente vendido para ganhar força no mercado.


JA – Vendido a quem tem potencial económico para o pôr em execução.
HV –
Sim, esse é o conceito da startup. A ideia é vender, num curto espaço de tempo, a um investidor. Por isso é que as startups têm uma fase de incubação, depois de aceleração e nesta fase fazem “pitch” para conseguirem levantar capital. Ou para ganhar escala ou para serem alienadas para a pessoas que adquirem o know how para o incorporar nas suas organizações.


JA – Como vai o Algarve nesse mundo das startups? Tem crescido?
HV –
Sim, e os programas de apoio – apoios comunitários, por exemplo – também se destinam a essas empresas. E o Algarve STP que é uma associação criada pela Universidade, pela ANJE, município de Faro e de Loulé (e hoje com mais entidades) que tem a missão de dinamizar o empreendedorismo e o pólo tecnológico que está a ser construído pela Universidade do Algarve.


JA – A “bazuca” europeia será uma oportunidade para as empresas algarvias, nomeadamente as geridas por jovens?
HV –
Não sei.


JA – Há muito investimento nos recursos hídricos, mas sobra alguma coisa para as empresas…
HV –
O PRR é essencialmente orientado para três eixos: a transição digital, a transição ambiental e os organismos públicos.


JA – Mas também para a diversificação da economia.
HV –
Só 20% de todo o PRR é que será destinado às empresas. Ou seja, 80% está destinado essencialmente a organismos públicos centralizados e descentralizados. E este é um percentual nacional. Ainda não está definido como será no Algarve. Nós defendemos em sede de discussão de contributos que deveria ser aumentado o valor para as empresas, o que foi acedido nalguma medida. O que importa mais é que se chegue às pequenas e médias empresas, às startup, às nanoempresas, que é isso que sustenta a nossa economia. A minha dúvida é de que forma é que nós podemos desburocratizar. Porque se continuarmos a burocratizar muitas dessas empresas não conseguem ter acesso a estes fundos porque não conseguem candidatar-se a eles.


JA – A burocracia continua a ser um grande obstáculo ao desenvolvimento?
HV –
Sim, as estruturas intermédias do Estado não estão suficientemente capacitadas em número para aceder de uma forma célere à análise dos projetos. Há estruturas do Estado com gorduras mas essas estruturas descentralizadas que têm em mão as candidaturas normalmente têm poucos recursos.


JA – Não lhe parece que há empresas que, perante essa torrente burocrática, mais não fazer do que fugir entre os pingos da chuva e viverem exclusivamente de fundos comunitários? Que são subsídiodependentes de Bruxelas?
HV –
Não vejo isso dessa forma. Por isso é que nós somos contra a burocracia. O sistema beneficia algumas empresas mas não diretamente dessa forma. Beneficia porque elas estão adaptadas e têm na sua génese capacidade de poder olhar para projetos e para fundos e poder contratar empresas que são especializadas nessa captação para poderem aceder a esses fundos. Vamos ser claros: uma empresa com dois ou três trabalhadores tem capacidade de contratar uma empresa de consultadoria para desenvolver um projeto a fundos comunitários? Não tem! Porque não tem liquidez, nem recursos internos para aceder à carga burocrática para um controlo financiado. O sistema beneficia as empresas e entidades que têm alguma capacidade de poder fazer estes projetos. As empresas que não têm conhecimentos nem capacidade ficam à margem destes programas. Por isso é importante dotar os organismos que avaliam estas candidaturas de mais pessoas; e arranjar uma entidade/veículo paralela que possa pôr em prática a execução destes fundos. Uma task force para executar esses fundos.


JA – Tem esperança que os empresários algarvios consigam sair desta crise que adveio da pandemia? Está otimista?
HV –
Otimismo e resiliência são os nomes do meio de qualquer empresário. Senão não era empresário. Estou esperançoso em relação à recuperação económica mas não num curto espaço de tempo. E é aí que temos que nos centrar: como podemos sem rodeios encontrar formas de apoiar os empresários. Para manter os postos de trabalho, isso é que é o essencial. Temos que apoiar empresários não como um fim em si mas para mantermos os postos de trabalho. Porque se não apoiarmos os empresários eles não vão manter os postos de trabalho e se eles não forem mantidos vamos ter uma crise social e aumentar ainda mais o desemprego. A recuperação numa região como o Algarve que vive muito do Turismo só acontecerá com os números de turistas de 2019 em 2013. Temos que ser realistas e saber como podemos apoiar os empresários durante dois anos.

JA – O Turismo numa região destas, de sol e mar, será sempre o nosso ganha-pão, ou não?
HV –
Não temos turismo a mais, temos é outros setores de atividade a menos. Não basta estalar os dedos e dizer que amanhã queremos diversificar. Os partidos dizem que são contra a monocultura do turismo, mas o que é que fazem de diferente? Isso não acontece numa legislatura, acontece em duas décadas.


JA – Mas está otimista quanto ao futuro?
HV –
Sim, temos que estar sempre otimistas em relação ao futuro.

João Prudêncio

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