O Tribunal Constitucional (TC) não autorizou a suspensão dos subsídios de férias e de Natal a funcionários públicos ou aposentados, mas o Governo conseguiu por via “administrativa” o mesmo efeito.
O aumento dos impostos e as reduções já corta o equivalente a dois subsídios aos funcionários públicos que auferem mais de 1648 euros de rendimento bruto mensal. As contas, feitas pelo Deloitte para o Expresso, têm por base um solteiro, sem dependentes e sem despesas.
Nos pensionistas, a mesma realidade ocorre apenas a partir do patamar dos 4370 euros de pensão mensal bruta, graças à aplicação da nova Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) e aos cortes nas pensões.
Em julho de 2012, o TC declarou que a suspensão dos subsídios era inconstitucional, embora tenha permitido que vigorasse nesse ano, atendendo ao estado de emergência das contas públicas do país (e por já se estar a meio do ano orçamental).
Para compensar este chumbo, o Governo avançou com uma sobretaxa de 3,5% no IRS para a generalidade dos trabalhadores.
Entretanto, para aliviar este esforço fiscal, o Executivo permitiu que em 2013 as empresas pudessem fasear 50% do pagamento dos subsídios de férias e de Natal em 12 prestações mensais (os chamados duodécimos), tendo os patrões de pagar a outra metade nos prazos habituais.
A medida (que, tal como a sobretaxa, se mantém este ano) é possível com a suspensão temporária das normas do código do trabalho sobre as regras de pagamento dos salários e pensões.
Em 2014, houve novos aumentos de impostos, com a subida da contribuição para a ADSE (sistema de saúde dos trabalhadores do Estado do qual beneficiam também os reformados da função pública) e com a nova CES.
No caso da ADSE, a comparticipação já está nos 3,5% desde 1 de abril, o mesmo dia em que entrou em vigor, a que se soma a nova CES para as pensões acima dos 1.000 euros brutos (antes era a partir dos 1350 euros) – e que agora também se aplica aos reformados do Estado, já que não avançou a convergência entre os sistemas de pensões privado e público.
Tudo somado, e na prática, o Governo conseguiu a mesma poupança que pretendia com a suspensão dos subsídios. Ou seja, embora os salários e pensões continuem a ser pagos em 14 ‘prestações’, a verdade é que o rendimento auferido, em muitos casos, equivale ao que era ganho em 12 meses em 2011 (e nesse ano já houve cortes progressivos, entre 3,5% e 10%, nos salários dos funcionários públicos).
“Alisamento dos salários”
Foi a suspensão dos dois vencimentos extra, conhecida no Orçamento do Estado para 2012, que desencadeou, em finais de 2011, o debate sobre a possibilidade de os salários e pensões passarem no futuro a ser pagos em doze vezes, já que começaram a pairar dúvidas sobre a reposição dos subsídios.
Ou seja, a ideia era integrar os subsídios nos salários. Os defensores desta medida argumentaram que o rendimento mensal iria aumentar, evitando picos de consumo, além de aliviar a tesouraria das empresas e do Estado. Mas o turismo iria perder, já que as férias são, muitas vezes, pagas com os subsídios. Além de poder afetar a poupança.
A discussão passou da esfera dos economistas e dos empresários para o Governo, onde tinha adeptos. Abolir o 13º e 14º meses, fazendo aquilo a que se chama um ‘alisamento dos salários’, só pode acontecer depois desta alteração ser negociada em concertação social.
O subsídio de Natal (ou 13º mês) foi instituído durante o Estado Novo por Marcello Caetano, em 1972, através do decreto-lei 457/72. O primeiro artigo desta lei dizia: “É concedido, no mês de dezembro de 1972, aos servidores do Estado, civis e militares, na efetividade de serviço, na reserva, aposentados ou reformados, bem como aos pensionistas a cargo do Ministério das Finanças ou do Montepio dos Servidores do Estado, um suplemento eventual de ordenado ou pensão, de importância igual ao quantitativo do ordenado ou pensão mensal a receber em 1 do mesmo mês”. Era apenas dirigido aos funcionários públicos, mas mais tarde foi alargado para a generalidade dos restantes trabalhadores, logo depois do 25 de Abril de 1974.
Em agosto de 1974 foi criado, também para os funcionários públicos, o subsídio de férias (conhecido por 14º mês), “equivalente a metade da remuneração mensal”, segundo o decreto-lei publicado na altura. Este decreto também aumentou “substancialmente os vencimentos do funcionalismo público civil”. E também foi adotado pelo sector privado.
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