Manuel Pessanha

Camareiro-mor do infante D. Henrique e Comendador de Castro Marim

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São frequentes as obras que, ao tratarem Castro Marim ou o Algarve Oriental da centúria quatrocentista, fazem referência a Manuel Pessanha enquanto homem incumbido por D. Afonso V de vários aspectos relativos ao controlo e administração do território. Porém, pouco se sabe sobre este indivíduo, que parece ter granjeado a estima e a protecção do rei “Africano” e, principalmente, do infante D. Henrique. Posto isto, torna-se pertinente esclarecer o que realmente se sabe sobre este comendador de Castro Marim.

Capa do Vol. X de Monumenta Henricina

Ora, como anteriormente referimos, um dos documentos a que frequentemente se faz referência ao tratar a Castro Marim do século XV é a Carta de el-rei D. Afonso V, a nomear Manuel Pessanha, camareiro-mor do infante D. Henrique e Comendador de Castro Marim, para guarda dos portos do reino do Algarve e a dar-lhe facilidades e instruções para reprimir o contrabando que por ali se faz e para processar os delinquentes na vila e termo, em 2 de Junho de 1450. Este documento da Chancelaria de D. Afonso V, que se encontra à guarda do Arquivo Nacional da Torre do Tombo (lv. 34, fl. 123) e que foi transcrito e publicado no Volume 10 da Monumenta Henricina, faculta-nos algumas pistas de grande interesse. Antes de mais, convém esclarecer que Manuel Pessanha aparece referido não só como pertencente à casa do infante D. Henrique, como também era possuidor de um cargo de enorme relevo no contexto da hierarquia desta casa senhorial. Originalmente, o camareiro-mor compreendia um fidalgo que desempenhava funções particulares no serviço ao rei, estando encarregue de zelar pela câmara do seu senhor. Posteriormente, passou a designar um título nobiliárquico concedido pelo monarca a alguém que queria distinguir. Ora, neste caso, um título nobiliárquico concedido a um fidalgo ao serviço do infante D. Henrique, o governador da Ordem de Cristo.

O facto de Manuel Pessanha aparecer igualmente referido como comendador de Castro Marim, então a única comenda desta Ordem Militar no reino do Algarve, revela que tinha sido investido como cavaleiro da Ordem de Cristo e que tinha visto os seus serviços recompensados com um título honorífico. Esta comenda constituía, portanto, um prémio em reconhecimento pelos seus serviços, compreendendo o direito à administração da localidade e uma renda para sustentação do comendador beneficiário, o que configurava, desde logo, um recurso para os encargos da própria comenda. Resta-nos saber quais os serviços na origem desta distinção.

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Capa de O infante D. Henrique no Algarve (estudos inéditos), de Alberto Iria

De acordo com O Infante D. Henrique no Algarve, de Alberto Iria, Manuel Pessanha era filho de Roiz Pessanha e de D. Isabel, descendente da “célebre dinastia genovesa dos nossos almirantes do Reino”. Dinastia, aliás, que detinha o almirantado nesse mesmo ano de 1450, já que por então o almirante do reino era Lançarote Pessanha, como podemos comprovar através de outros documentos à guarda da Torre do Tombo (Gaveta 3, maço 6, Nº 1) ou mesmonoutros estudos, como Os Almirantes Pessanhas e sua descendência, publicado em 1923. Ora, se tivermos em consideração que Manuel Pessanha era descendente de uma linhagem experiente no comando da guerra naval, que era cavaleiro da Ordem de Cristo e que o governador desta Ordem auferia, desde 1433, um quinto das presas tomadas pelos navios que praticavam a guerra de corso, bem podemos conjecturar que o então comendador de Castro Marim teria sido um dos homens ao serviço do infante D. Henrique no golfo luso-hispano-marroquino. De resto, o facto de D. Afonso V, em 1450, incumbi-lo da guarda dos portos do reino do Algarve e dar-lhe poderes para reprimir o contrabando e castigar os culpados, sugere que Manuel Pessanha era um homem experiente no domínio naval, já que as “cousas defesas” referidas pelo monarca – compreenda-se armamento contrabandeado – afluíam aos portos do Algarve essencialmente por via marítima.

Também o regimento que D. Afonso V dirigiu a Manuel Pessanha sobre as enxávegas dos pescadores de Castro Marim, em 6 de Abril de 1453, sugere o entendimento do comendador a nível dos assuntos do mar, auferindo este anualmente “vinte mil rreaes da rrenda por o dereito que o comendador a nas exaveguas(A.N.T.T., Leis, maço 1, Nº 166). Não se sabe muito mais sobre a acção de Manuel Pessanha em Castro Marim, nem mesmo sobre a sua relação com o infante D. Henrique. Alberto Iria, na obra anteriormente mencionada, refere que este comendador acompanhou o “Navegador” na conquista de Alcácer Ceguer, em 1458. Porém, nem este autor refere em que fonte se baseou para sustentar tal afirmação, nem o Cap. CXXXIX da Chronica d’ El-Rei D. Affonso V, que narra a conquista desta praça norte-africana, refere a participação de Manuel Pessanha. Sabemos sim, pela data referida por Rui de Pina, que era Manuel Pessanha a deter a comenda de Castro Marim quando o infante D. Henrique ali recebeu o infante D. Fernando ao regressar de Ceuta em 1452. Ora, sendo Manuel Pessanha camareiro-mor do infante D. Henrique e comendador de Castro Marim, é natural que ali estivesse durante um momento tão significativo para a História desta praça de guerra da foz do Guadiana.

*Historiador

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