Mineiros chilenos: sonho da superfície transformou-se em pesadelo

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Os 33 mineiros chilenos que, há um ano, protagonizaram um dos grandes feitos de sobrevivência da história recente encontram-se agora a lidar com os problemas decorrentes da experiência.

Deve haver poucas pessoas que não se recordem do resgate dos mineiros chilenos, há um ano, nas minas de Copiapó.

Desde a famosa mensagem que, colada a um tubo, revelou às autoridades, que se preparavam para desistir da busca, que 33 mineiros tinham sobrevivido à derrocada (“Estamos bien en el refugio, los 33”), até às cenas apoteóticas e de fervor patriótico que se registaram na saída dos mineiros da sua “prisão subterrânea”, a experiência deixou uma marca indelével na consciência coletiva global.

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O mundo sofreu com o destino dos 33 mineiros – cujo espírito de esperança lhes permitiu sobreviver durante 69 dias enclausurados a 700 metros da superfície num espaço exíguo -, ficou preso aos diretos televisivos durante a longa operação de resgate e celebrações subsequentes pelo estrondoso êxito da aventura.

Os mineiros tornaram-se ícones de sobrevivência. Milionários ofereceram-lhes casas e dinheiro para refazerem as vidas. Convites voaram de diversos cantos do mundo para partilharem a sua incrível história. O próprio Presidente do Chile, Sebastián Piñera, aproveitou a onda patriótica originada pelos mineiros.

As ilhas gregas, Reino Unido, Israel, Los Angeles e até a Disney World foram todos visitados pelos 33 sobreviventes. Fizeram-se muitas promessas de dinheiro, doações, até um filme de Hollywood. Hoje, porém, a esperança esbateu-se no pó da mina.

“Não podemos apagar as memórias”

Duas vezes por mês, Jimmy Sánchez fez uma viagem de 11 horas a Santiago do Chile para consultar um psiquiatra. É um dos nove mineiros que se encontra de baixa prolongada com salário, devido a stresse pós-traumático. Outros, que preferem não dizer o nome, estão a ser vigiados por médicos privados. As insónias e o pânico voltaram.

Em declarações ao “The New York Times”, Jimmy Sánchez confessou os problemas que o têm atormentado, bem como a outros dos mineiros. “A maioria de nós está com os mesmos problemas psicológicos e emocionais. Era o medo de nunca mais vermos as nossas famílias, de morrer. Não podemos simplesmente apagar estas memórias”.

Álcool e drogas

Dos 33 mineiros resgatados com sucesso só quatro regressaram às minas. Aos restantes, os patrões temem que as sequelas do acidente lhes afetem o trabalho. Dois, Victor Zamora e Dário Segovia, tentam sobreviver vendendo fruta no mercado.

Edison Peña, o mineiro que se tornou famoso devido à sua paixão por Elvis Presley e gosto por correr, viu-se envolvido num mundo novo. Visitou a casa de Elvis, Graceland, correu a maratona de Nova Iorque e foi convidado do programa de David Letterman. A pressão mediática foi demasiada e virou-se para o álcool e para as drogas. Atualmente, encontra-se a viver numa clínica psiquiátrica.

“Fizeram-nos heróis. Agora sentimo-nos um pouco abandonados. No fim, estamos a vender amendoins. É irónico, não é?”, diz Jimmy Sánchez.

Aproveitar oportunidades

Médicos dizem agora que muitos dos mineiros sobrevivem à custa de um cocktail diário de sedativos e antidepressivos.

Porém, alguns mineiros têm efetivamente aproveitado a fama que o resgate lhes trouxe enquanto o acordo para a realização do filme sobre a história que viveram debaixo de terra não é concretizado.

Mario Sepúlveda, que ficou conhecido como o “Súper Mário” por ser o mestre de cerimónias dos vídeos que chegavam à superfície e pelos festejos frenéticos que protagonizou à saída da mina, iniciou uma empresa especializada em discursos motivacionais.

“Se for persistente e continuar a trabalhar, um dia posso vir a ser milionário” afirmou o antigo mineiro ao “The New York Times”, antes de partir para mais uma conferência na Costa Rica.

Ajuda suíça

Já Pedro Cortês, que durante os 69 dias de cativeiro fui um dos responsáveis pela instalação e manutenção de sistemas vídeo para os mineiros conseguirem comunicar com as famílias, está a estudar eletrónica na universidade, comparticipado por um milionário suíço que leu a história do seu desejo de se formar superiormente.

O sobrevivente vendeu mesmo a moto que lhe ofereceram após o resgate, para sustentar a família e a filha de 8 anos e, agradecendo o gesto do milionário, ofereceu-lhe uma bandeira chilena assinada pelos 33 mineiros.

“Tenho que pôr a minha família à frente, não podemos estar no mesmo sítio onde estávamos antes. Lutaram por mim durante 69 dias. Agora é a minha vez de lutar”, justificou Pedro Cortês.

Uma luta pela sobrevivência que ainda dura.

JA/Rede Expresso
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