Poeta António Aleixo nasceu há 123 anos em VRSA

ouvir notícia

Esta sexta-feira, 18 de Fevereiro, assinala-se 123º aniversário do nascimento do poeta António Fernandes Aleixo.

Nascido a 18 de Fevereiro de 1899, em Vila Real de Santo António, é considerado um dos poetas populares portugueses de maior relevo, afirmando-se pela sua ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo é recordado como homem simples, humilde e semi-analfabeto. Ainda assim, deixa como legado uma obra poética singular no panorama literário português da primeira metade do século XX.

A vida do poeta vila-realense esteve marcada pelo sofrimento e a pobreza, com mudanças de emprego, emigração, tragédias familiares e doenças ao longo da vidam mas a figura de homem humilde e simples não abafou o espírito critico, a personalidade rica, vincada e conhecedora das diversas realidades da cultura e sociedade do seu tempo. Do seu percurso de vida fazem parte profissões como tecelãopolícia e servente de pedreiro, trabalho este que, como emigrante, exerceu em França.

- Publicidade -

De regresso ao Algarve, estabeleceu-se novamente em Loulé, onde residiu durante a infância, e ai passou a vender cautelas e a cantar as suas produções pelas feiras portuguesas, atividades que se juntaram às suas muitas profissões e que lhe renderia a alcunha de «poeta-cauteleiro».

Faleceu vítima de uma tuberculose, a 16 de novembro de 1949, doença que tempos antes havia também vitimado uma de suas filhas.

António Aleixo, um semi-analfabeto, sabia ler mas não era capaz de escrever com correção. Há, no entanto, nos seus versos uma correção de linguagem e, sobretudo, uma expressão concisa e original de amarga filosofia, aprendida na escola impiedosa da vida, que não deixam de impressionar.

Além disso, o tom sentencioso da maior parte das quadras e o facto de serem produto de uma espontaneidade, é surpreendente se se considerar a fraca preparação intelectual do poeta popular.

dedicatória ao poeta Cândido Guerreiro autografada por António Aleixo

A vida é uma ribeira;
Caí nela, infelizmente…
Hoje vou, queira ou não queira,
Aos trambolhões na corrente.

Crês que ser pobre é não ter
Pão alvo ou carne na mesa?
Mas é pior não saber
Suportar essa pobreza!

O luxo valor não tem
Nos que nascem p’ra pequenos:
Os pobres sentem-se bem
Com mais pão luxo a menos!

A esmola não cura a chaga;
Mas quem a dá não percebe
Ou ela avilta, que ela esmaga
O infeliz que a recebe.

A ninguém faltava o pão,
Se este dever se cumprisse:
– Ganharmos em relação
Com o que se produzisse

Quadras

O homem sonha acordado;
Sonhando a vida percorre…
E desse sonho dourado
Só acorda, quando morre!

Quantas, quantas infelizes
Deixam de ser virtuosas…
E depois são seus juízes
Os que as fazem criminosas!…

Sem que o discurso eu pedisse,
Ele falou; e eu escutei.
Gostei do que ele não disse;
Do que disse não gostei.

Tu, que tanto prometeste
Enquanto nada podias,
Hoje que podes – esqueceste
Tudo quanto prometias…

Chegasses onde pudesses;
Mas nunca devias rir
Nem fingir que não conheces
Quem te ajudou a subir!

Os que bons conselhos dão
Às vezes fazem-me rir,
– Por ver que eles próprios são
Incapazes de os seguir.

Mesmo que te julguem mouco
Esses que são teus iguais,
Ouve muito e fala pouco:
Nunca darás troco a mais!

Entra sempre com doçura
A mentira, pr’a agradar;
A verdade entra mais dura,
Porque não quer enganar.

Se te censuram, estás bem,
P’ra que a sorte te perdure;
Mal de ti quando ninguém
Te inveje nem te censure!

A partir da descoberta de Joaquim de Magalhães, o grande responsável por “passar a limpo” e registar a obra do poeta, António Aleixo passou a ser apreciado por inúmeras figuras da sociedade e do meio cultural algarvio. Também é digno de registo José Rosa Madeira, que o protegeu, divulgou e coleccionou os seus escritos, contribuindo no lançamento do primeiro livro, Quando Começo a Cantar (1943), editado pelo Círculo Cultural do Algarve.

A opinião pública aceitou a primeira obra de António Aleixo com bom agrado, tendo sido bem acolhida pela crítica. Com uma tiragem de cerca de 1 100 exemplares, o livro esgotou-se em poucos dias, o que proporcionou ao Poeta Aleixo uma pequena melhoria de vida, contudo ensombrada pela morte de uma filha sua, com tuberculose. Desta mesma doença viria o poeta a sofrer pelos tratamentos que a vida lhe foi impondo, tendo de ser internado no Hospital — Sanatório dos Covões, em Coimbra, a 28 de junho de 1943.

Em Coimbra começa uma nova era para o poeta que descobre novas amizades e deleita-se com novos admiradores, que reconhecem o seu talento, de destacar o Dr. Armando Gonçalves, o escritor Miguel Torga, e António Santos (Tóssan), artista plástico e autor da mais conhecida imagem do poeta algarvio, amigo do poeta que nunca o desamparou nas horas difíceis. Os seus últimos anos de vida foram passados, ora no sanatório em Coimbra, ora no Algarve, em Loulé.

Carta de Fernando Laginha, secretário do poeta António Aleixo, endereçada ao Dr. Joaquim Peixoto Magalhães

A carta descreve a visita que Fernando Laginha terá realizado a António Aleixo, nas vésperas do seu falecimento, a 16 de novembro de 1949.

Nessa última visita, Laginha discute com Aleixo a publicação do Auto do Curandeiro, do qual Laginha já tinha escrito o «Prefácio», de duas páginas, em agosto de 1949.

A carta revela-nos que António Aleixo possuía algum dinheiro guardado para a publicação do livro, mas que achava preferível que a família o gastasse. As dificuldades eram muitas e o dinheiro escasso. A a edição do livro não era a principal prioridade. Havia uma família inteira e numerosa para sustentar, composta pela mulher e por seis filhos (quatro raparigas e dois rapazes). No entanto, Laginha, apercebendo-se que a publicação do auto podia vir a ser proveitosa num futuro próximo, incentiva Aleixo a realizar esse investimento, convencendo-o a desistir da ideia de não autorizar a sua publicação.

Auto do Curandeiro viria a ser impresso, postumamente, no início de 1950, em Faro, na Tipografia «O Algarve».

Percurso de Vida

1899 – 18 de Fevereiro – às 4 horas da manha, nasce António Aleixo, na freguesia e concelho de Vila Real de Santo António, filho de José Fernandes Aleixo, tecelão, e de Isabel Maria Casimiro, de ocupação domestica, naturais, ele da freguesia de S. Clemente, vila e concelho de Loulé, e ela de Vila Real de Santo António, onde se receberam e são paroquianos e residentes na Rua do Príncipe, neto paterno de António Fernandes Aleixo e de Francisca de Jesus e materno de Silvestre Casimiro e de Maria da Encarnação. Foram padrinhos Domingos Samídio, marítimo, casado, e sua filha, Luísa SamÍdio, solteira. Foi baptizado aos 24 dias do mês de Junho do ano de 1899, na Igreja Paroquial de Nossa Senhora da Encarnação de Vila Real de Santo António

1906 – Os pais de António Aleixo transferem-se para Loulé
1907 – António Aleixo começa a frequentar a escola. Aprende as primeiras letras
1909 – Depois de dois anos de escola, primeira revelação do talento de improvisador a cantar as janeiras
1912 – Aprendiz de tecelão, o ofício do pai. De 1912 a 1919 é a pratica do ofício. Como cantador de improvisos, em festas, por convite de amigos, às vezes retribuído, vai treinando o seu jeito para versejar (ou versar, como ainda hoje se diz, na gíria popular dos poetas espontâneos)
1919 – Apurado para o serviço militar, em Faro
1920 – 18 de Janeiro – soldado no Regimento de Infantaria 4
29 de Abril – dado como pronto da instrução de recruta passa à classe de soldado aprendiz de corneteiro
1922 – Alistamento na polícia, em Faro. É o guarda n.º 44 um aumentado ao efectivo deste corpo de polícia, como guarda de 2ª, em 7 de Julho, sendo comissário o cidadão Carlos Augusto Lyster Franco, professor e pintor
1923 – 27 de Novembro – louvado pelo mesmo comissário de polícia
1924 – Casamento, em Loulé

Retrato António Aleixo – Autor: Luís Furtado

1928 – 1930 – Ida para França, como servente de pedreiro
1931 – Regresso a Portugal
1931 – 1933 – Residência em Loulé. É cauteleiro e vende gravatas
1937 – Classificado em 4º lugar nuns jogos florais em Faro, no Ginásio Clube

1939 – 1940 – Um amigo do poeta, José Rosa Madeira, junta algumas quadras, em duas folhas de papel. Vão ser o núcleo do seu primeiro livro – Quando Começo a Cantar…
1940 – Operação ao estômago, em Lisboa
1943 – Lançamento do primeiro livro, começando a vender no dia 25 de Abril, domingo de Páscoa, por iniciativa do Circulo Cultural do Algarve
– Agravamento do estado de saúde. A tuberculose obriga a internamento, em Coimbra, no Sanatório dos Covões
– Maio – Primeira referência à publicação de Quando Começo a Cantar… em artigo de Cândido Marrecas no jornal de Beja
1943 a 1949 – Permanência no Sanatório, com curtas visitas família, até que, no Outono de 1949, regressa para ficar
16 de Novembro de 1949 – Morte de António Aleixo. O poeta fica…

Obras Completas

QUANDO COMEÇO A CANTAR… – 1ª Edição, Faro, 1943; 2ª edição, Coimbra, 1948; 3ª edição, Lisboa, 1960
INTENCIONAIS – 1ª EDIÇÃO, Faro, 1945; 2ª edição, Lisboa, 1960
AUTO DA VIDA E DA MORTE (1 acto) – 1ª edição, Faro, 1948; 2ª edição, Faro, 1968
AUTO DO CURANDEIRO (1 acto) – 1ª edição, Faro, 1949; 2ª edição, Faro, 1964
ESTE LIVRO QUE VOS DEIXO… Volume I, 18ª EDIÇÃO, Lisboa, 2003
ESTE LIVRO QUE VOS DEIXO… Inéditos – Volume II , 13ª edição, Lisboa, 2003
INÉDITOS – 1ª edição, Loulé, 1978; 2º edição, Loulé, 1979

- Publicidade -
spot_imgspot_img

Deixe um comentário

+Notícias

Exclusivos

Deixe um comentário

Por favor digite o seu comentário!
Por favor, digite o seu nome

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.