O ano de 2023 antevia-se pelos principais agentes turísticos nacionais e regionais como “a maior oportunidade” para a retoma do turismo, sem qualquer restrição, no período pós-pandemia.
No mês de junho de 2023 o setor do alojamento turístico em Portugal contabilizou 2,9 milhões de hóspedes e 7,4 milhões de dormidas, o que equivale a crescimentos de 7,1% e 3,7%, respetivamente (+12,2% e +9,9% em maio de 2023, pela mesma ordem), relativamente a 2022, segundo dados divulgados no final de julho pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
Apesar dos resultados positivos em termos absolutos, no mês de junho as dormidas dos portugueses diminuíram 6,7%, totalizando 2,2 milhões de dormidas, enquanto os mercados externos aumentaram 8,7%, correspondendo a 5,3 milhões de dormidas. É face a junho de 2019 que se observa um abrandamento no crescimento turístico, com aumentos de 0,5% nas dormidas de residentes e 5,2% nas de não residentes.
Para além da descida da procura de portugueses, o número de noites que os turistas passam em Portugal continuou também a decrescer. A estada médica nas unidades de alojamento turístico em junho ficou-se pela 2,61 noites, o que significa uma queda de 3,1% se comparamos com igual período do ano passado (e uma descida de 2% no mês de maio). A descida da estada média verificou-se em todas as regiões, à exceção do Algarve, onde subiu 1,6%.
Número de dormidas na região fica abaixo dos valores pré-pandemia
Em junho, o Algarve aglutinou 30,4% das dormidas, seguido da Grande Lisboa (24,5%) e do Norte (16,4%). Em comparação com junho de 2019, o Algarve registou um decréscimo de 6,8% (-0,9% em maio).
O INE adianta que “face a junho de 2019, as dormidas de residentes registaram um decréscimo no Algarve (-17,9%) e na Área Metropolitana de Lisboa (-2,5%). Em sentido contrário, as dormidas de portugueses na Madeira aumentaram 33%.
Entre os maiores crescimentos face a junho de 2019 destacou-se o Norte (+17,1%), a Região Autónoma dos Açores (+16,7%) e a Região Autónoma da Madeira (+14,3%), regiões que têm ganhado cada vez mais turistas nos últimos anos.
Relativamente às dormidas de não residentes, continuaram a decair no Algarve (-2,9%) e no Centro (-1,8%), face a junho de 2019. Em rota contrária, os Açores registaram o maior acréscimo (+25,6%).
Dos 17 principais mercados emissores – que representaram 87% do total de dormidas de não residentes – a Finlândia, os Países Baixos e a Bélgica registaram decréscimos nas dormidas (-19,3%, -3,8% e -1,2%, respetivamente), face a junho de 2022. Entre os mercados que mais cresceram em junho (+36,2% e +22,2%), estão o Canadá e os Estados Unidos, respetivamente.
De acordo com o INE, as dormidas de residentes provenientes do Reino Unido (20,8% do total das dormidas de não residentes em junho) aumentaram ligeiramente face a junho de 2019 (+0,6%), estando, ainda assim, em abrandamento pelo terceiro mês consecutivo. Tendo em conta a média dos primeiros seis meses do ano, as dormidas aumentaram 18,8%, tendo havido um crescimento de 7,7% nos residentes e de 24,2% nos estrangeiros. Comparando com o período homólogo de 2019, as dormidas cresceram 10,7%.
A taxa líquida de ocupação-cama nos estabelecimentos de alojamento turístico (53,0%) diminuiu 0,6 p.p. em junho (+1,9 p.p. em maio). A taxa líquida de ocupação-quarto (63,5%) manteve o nível de 2022 (+3,3 p.p. em maio). Face a junho de 2019, registaram-se decréscimos de 2,2 p.p. e 0,2 p.p., respetivamente, sendo as primeiras descidas desde setembro de 2022, face aos níveis de 2019.
Julho mantém tendência de descida
Em julho, as unidades de alojamento no Algarve registaram uma descida de 1,1 pontos percentuais na taxa de ocupação por quarto face ao mesmo mês de 2019, indicou na terça-feira a Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA).
Segundo os dados provisórios da maior associação hoteleira do sul do país, a taxa de ocupação por quarto foi de 82,3%, 1,1 pp (pontos percentuais) abaixo da verificada em 2019 e 4,2pp abaixo da verificada em julho de 2022.
Os mercados que mais contribuíram para a descida homóloga verificada foram o português com -7,4pp e o alemão com -3,3pp. Em sentido oposto, os mercados com maiores subidas foram o irlandês com +5,4pp, o britânico, com +3,6pp e Estados Unidos e Canadá com mais 1,0pp.
Por zonas geográficas, as maiores subidas face a 2019 ocorreram nas zonas de Tavira (+10,9pp), Carvoeiro/Armação de Pêra (+3,6pp) e Vilamoura-Quarteira/Quinta do Lago (+3,4pp). Por outro lado, as principais descidas, face a 2019, verificaram-se em Monte Gordo/VRSA (-10,7pp) e Lagos/Sagres (-4,9pp).
A estadia média foi de 5,2 noites, um aumento de 2,4% face a 2019. As estadias médias mais prolongadas foram as do mercado irlandês com 7,2 noites, seguido do mercado alemão, com 6,6 noites.
Preços aumentam, turismo abranda
Contactado pelo JA, o presidente da AHETA, Hélder Martins, confirma que houve “um abrandamento em junho, depois de vários meses com números completamente diferentes, pois foram os melhores dos últimos 15 a 20 anos”.
Na opinião de Hélder Martins, este abrandamento está relacionado “com a entrada em vigor da época mais alta da atividade, onde os preços aumentam”, coincidindo também “com os aumentos brutais das taxas de juro”.
“Muitas pessoas com empréstimos, por exemplo à habitação, ficaram impedidas de fazer férias ou tiveram de as fazer noutros destinos mais baratos. Este é um problema da maioria dos países emissores de turistas para o Algarve, com maior destaque para os alemães, holandeses e especialmente os portugueses, o que causou reduções na ocupação em zonas turísticas da bacia do Mediterrâneo”, explica.
Para o presidente da AHETA, o Algarve “tem vindo a melhorar o seu produto e a manter uma elevada taxa de fidelização de clientes que repetem a sua experiência na nossa região”.
“Muitas unidades, até de categorias mais altas, continuam a ter muito bom desempenho neste período. Portanto, não é apenas uma questão da política de preços, mas sim das dificuldades económicas das famílias. No contexto do produto de sol e praia, o Algarve é incondicionalmente líder em Portugal e na Europa. Quando escolhemos o nosso destino de férias não podemos olhar apenas para o preço, pois aí, decerto, encontraremos outros destinos mais baratos”, considera.
Para os próximos meses, Hélder Martins acredita que “estarão na mesma tónica, pois o tipo de cliente que nos procura serão famílias.
“Poderemos vir a ter bons desempenhos nos meses a seguir ao verão, embora, para muitas empresas em que esta estação é a oportunidade de gerar recursos para enfrentar a época baixa, esta situação poderá ser problemática”, salienta.
Segundo o presidente da AHETA existem vários itens que têm de ser trabalhados, como é o caso do orçamento da RTA “que é praticamente o mesmo há 20 anos, sem capacidade para implementar campanhas de promoção junto do mercado interno alargado”, como Portugal e Espanha.
Hélder Martins destaca ainda “a questão da pesada carga fiscal das famílias e das empresas”, além dos “investimentos estruturantes no Algarve, como o tema da água, que, apesar de estarem hoje praticamente definidos, demorarão anos a implementar”.
“Resumindo, temos este ano mais disponibilidade para aceitar reservas para este período do ano, onde o Algarve tem tanto para oferecer”, conclui.
Expetativas continuam “positivas”
Questionado sobre a desaceleração do crescimento do número de dormidas na região face a 2019, André Gomes, recém-eleito presidente da Região de Turismo do Algarve (RTA), faz duas distinções: “no primeiro semestre de 2023, e no total do país, as dormidas de turistas aumentaram 18,8% face ao período homólogo de 2022; no Algarve, e no mesmo período, a subida foi na ordem dos 13,2%, segundo os dados do INE. De janeiro a junho, o alojamento turístico da região totaliza 8,5 milhões de dormidas, um quarto de todas as dormidas realizadas no país”, explica.
“Outra coisa é falarmos apenas das dormidas no mês de junho. Neste mês, em 2023, o Algarve cresceu 1,3% face a 2022; mas se compararmos junho de 2023 com junho de 2019, houve um decréscimo de 6,8%. Não obstante estes últimos dados, ressalvamos que no primeiro semestre do ano, em particular, nos meses de época baixa – entre janeiro e maio – as dormidas na região aumentaram 1,5% face ao mesmo período de 2019 – melhor ano de sempre do turismo na região e no país. Temos, por isso, de estar atentos a este desvio e interpretar as suas causas, mantendo a expetativa de um balanço positivo do setor no Algarve no final do ano”, esclarece ao JA.
Ainda assim, avança que na origem desta quebra está “particularmente o mercado interno, pois as dormidas dos estrangeiros estão muito próximas dos valores pré-pandemia”, declara.
“O aumento das prestações bancárias e dos preços, devido à inflação, e a consequente diminuição do poder de compra das famílias levam a um menor investimento disponível para consumos de lazer, contribuindo para esta diminuição. Na verdade, para sermos rigorosos devemos referir que tal não se verifica apenas ao nível do mercado nacional, mas também ao nível de outros mercados emissores cujas economias nacionais encontram os mesmos problemas, como é o caso dos mercados espanhol e alemão”, especifica o responsável.
Concorrência é “muito importante”
Sobre o crescimento da atividade turística em zonas emergentes como o Norte, Alentejo e Ilhas, André Gomes não equaciona uma saturação do “produto” Algarve. “O desenvolvimento da oferta turística noutras regiões é muito importante para o crescimento do Turismo em Portugal e para a criação de propostas diferenciadas e dirigidas a distintos públicos. A concorrência é muito importante e só valoriza os destinos num todo. Não considero, portanto, que os turistas estejam saturados do Algarve porque também aqui temos sabido criar produtos diferenciadores e de qualidade reconhecida internacionalmente, valorizando, diversificando e qualificando a nossa oferta” contrapõe.
Para agosto, o presidente da RTA avança que “são esperadas taxas de ocupação superiores a 90%” e em setembro “muito próximas desse valor, fazendo com que seja difícil crescer em procura durante a época alta do verão”, afirma ao JA.
Crescimento em valor
“Estamos a crescer mais em valor do que em procura, sobretudo fora da época alta da atividade turística, normalmente próxima da capacidade limite. E isso é positivo para o destino, que tradicionalmente regista picos de procura muito elevados nos meses de junho a setembro. Em resultado disso, os proveitos estão muito acima do que havia antes da pandemia e atingiram valores recorde, crescendo 35,7% de janeiro a maio de 2023, face ao período homólogo de 2019”, defende André Gomes.
Gonçalo Dourado e Joana Pinheiro Rodrigues