Citius: o problema já não é informático. É constitucional

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No último parágrafo do despacho que analisou um pedido de um dos arguidos do processo Face Oculta, a juíza Marta de Carvalho é clara: o decreto-lei do Governo que suspende os prazos processuais enquanto durarem os problema do sistema informático Citius sofre de “inconstitucionalidade orgânica” porque não foi autorizado pala Assembleia da República.

Quer dizer: segundo esta juíza, que não participou no julgamento mas foi nomeada para tratar de todas as outras questões, o decreto-lei do Governo devia ter sido aprovado pela Assembleia e ganhar, assim, força de lei.

“A juíza levanta uma questão pertinente e terá mesmo razão”, admite Jónatas Machado, constitucionalista e professor de Direito da Universidade de Coimbra. “De facto a Constituição diz que só a Assembleia da República pode legislar ou então o Governo com autorização da Assembleia. Não foi o que aconteceu”.

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Jónatas Machado afirma: “a Constituição diz que só a Assembleia da República pode legislar ou então o Governo com autorização da Assembleia. Não foi o que aconteceu”.

Agora, e de acordo com este professor, “se a tese dessa magistrada for seguida poderá dar-se uma reação em cadeia com influência no desfecho dos processos”. Como? “Processos que não estavam prescritos afinal podem estar, prazos que não estavam ultrapassados, afinal estão. Uma confusão”.

O argumento decisivo

Quando 3,5 milhões de processos ficaram presos na versão antiga do Citius durante a entrada em vigor do novo mapa judiciário, o Governo fez um decreto lei a suspender todos os prazos enquanto o crash durasse, uma vez que os advogados não tinham acesso aos processos, especialmente na área cível.

O Governo não fez nada e agora quando se chega aos casos concretos o resultado só podia ser este”, lamenta Mouraz Lopes.

Carlos Vasconcellos, ex-dirigente da Refer e arguido no processo Face Oculta, perguntou então à juíza da Comarca de Aveiro se a suspensão dos prazos se aplicava ao tempo que tinham para recorrer da sentença que o condenou a uma pena suspensa de três anos. Marta de Carvalho explicou que não, que não se aplicava porque o processo é crime e os advogados podem ter acesso a todos os documentos (só os processos cíveis têm apenas existência digital), mas acrescentou que o “argumento decisivo” para rejeitar a pretensão do arguido era a inconstitucionalidade do decreto-lei do Governo.

“Assim que esse decreto foi apresentado nós dissemos que era inconstitucional. O Governo não fez nada e agora quando se chega aos casos concretos o resultado só podia ser este”, lamenta Mouraz Lopes, da Associação Sindical dos Juízes Portugueses.

O Expresso contactou o Ministério da Justiça que não quis comentar a posição da juíza do processo Face Oculta.

RE

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